Em 2008, o controle do diabete passou por uma reviravolta histórica: o Food and Drug Administration, órgão que regula a prescrição de medicamentos nos Estados Unidos, passou a exigir que todos os novos fármacos em pesquisa com potencial de tratar a doença deveriam comprovar que não prejudicavam o coração.
A decisão foi tomada após experts da Clínica Cleveland, em terras americanas, publicarem um artigo bombástico, em que a rosiglitazona — molécula já liberada para os pacientes e com um bom desempenho no ajuste das taxas de açúcar no organismo — esteve relacionada a um aumento de 40% no risco de problemas cardiovasculares. Obviamente, sua venda foi proibida em todo o mundo.
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Passados oito anos da mudança, novas investigações mostram que algumas drogas, além de não interferirem no coração, chegam a evitar panes cardíacas. É o caso da liraglutida, do laboratório Novo Nordisk. Em estudos apresentados durante o Congresso Brasileiro de Endocrinologia e Metabologia, realizado na Costa do Sauípe, na Bahia, o remédio, já disponível no Brasil, reduziu em 13% os casos de infarto e acidente vascular cerebral.
Para chegar a essa conclusão, mais de 9 mil diabéticos com alto risco cardiovascular foram divididos em dois grupos, que passaram por um tratamento a fim de regular colesterol alto e hipertensão. A diferença foi que a primeira turma tomou injeções com a liraglutida, enquanto a segunda recebeu agulhadas sem nenhuma ação terapêutica. Os resultados foram publicados no prestigioso periódico científico The New England Journal of Medicine.
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A molécula da Novo Nordisk faz parte da classe dos análogos de GLP-1, medicamentos que interferem em hormônios produzidos pelo intestino durante a digestão dos alimentos. “Isso aumenta a produção de insulina, substância que reduz a quantidade de glicose no sangue, e diminui a ação do glucagon, que tem o efeito contrário”, explica o endocrinologista Freddy Eliaschewitz, diretor do Centro de Pesquisas Clínicas, em São Paulo.
Mas como ela agiria no sentido de proteger o peito? “Acredita-se que a droga tenha efeitos anti-inflamatórios e atue contra a aterosclerose, processo de deterioração da parede dos vasos sanguíneos”, aposta. Essa ação evitaria entupimentos e a liberação de coágulos perigosos para o músculo mais importante do corpo.
A liraglutida é a segunda a mostrar esse efeito positivo. No ano passado, a empagliflozina, das farmacêuticas Boehringer Ingelheim e Eli Lilly, inaugurou esta nova era. Em experiências com mais de 7 mil voluntários, ela abaixou o risco de mortes cardiovasculares em 38%. Essa droga pertence à família dos inibidores de SGLT2.
“Eles são capazes de retirar o excesso de açúcar da circulação e eliminá-lo através da urina”, conta o endocrinologista Antonio Roberto Chacra, da Universidade Federal de São Paulo. A escolha de qual a melhor abordagem terapêutica para manter a doença do sangue doce sob rédea curta vai depender do médico e das características de cada paciente.
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A relação entre diabete e moléstias nos vasos e nas câmaras cardíacas se torna cada vez mais importante. Estimativas apontam que dois terços dos portadores dessa enfermidade morrem em decorrência de piripaques do coração. “Sem contar que cerca de 80% das internações entre eles se devem a doenças cardiovasculares”, calcula Chacra. Portanto, novas terapias que tragam esse benefício extra são muito comemoradas no meio médico. “Também devemos ter em mente que várias complicações podem ser evitadas com uma boa prevenção e visitas regulares ao profissional de saúde”, completa o especialista.
O jornalista viajou para o Congresso Brasileiro de Endocrinologia e Metabologia a convite da farmacêutica Novo Nordisk.