O diagnóstico de dengue é fundamental para o início precoce do tratamento e para descartar a possibilidade de outras doenças que apresentam sintomas semelhantes. Em ambiente laboratorial, a infecção é detectada a partir de diferentes métodos. Um se chama teste molecular, que busca o genoma do vírus em uma amostra e indicar até o sorotipo viral envolvido. Outras duas técnicas são as pesquisas de antígenos e de anticorpos.
Diferentemente das estratégias citadas anteriormente, os testes rápidos são de simples execução e não requerem a mesma estrutura. Eles podem ser feitos em unidades de saúde comuns e também são realizados em farmácias.
Diante do aumento expressivo de casos da dengue no Brasil, o Ministério da Saúde publicou um documento que orienta sobre o uso dos testes rápidos. Considerando as características da resposta do nosso organismo ao vírus, a nota técnica destaca que apenas o tipo de exame rápido que detecta antígenos deve ser usado para diagnóstico da infecção aguda.
Até o momento, foram registrados em 2024 mais de 2,9 milhões de casos prováveis no país, com 1 117 mortes confirmadas e 1 806 óbitos em investigação. As informações são do painel de monitoramento de arboviroses do ministério.
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Diferentes tipos de teste rápido
Os testes rápidos, conhecidos tecnicamente como ensaios imunocromatográficos, são amplamente utilizados em unidades públicas e privadas de saúde. Eles permitem a detecção de uma proteína produzida durante a infecção pelo vírus e também dois tipos de anticorpos.
A maioria dos exames oferece resultados de 15 a 20 minutos, tendo como vantagens o baixo custo e a fácil distribuição para localidades distantes. Vamos conhecer os detalhes de cada tipo.
No contexto da dengue, um dos principais está associado à detecção da proteína NS1, que integra o vírus da dengue e é produzido em grande quantidade e liberado na corrente sanguínea durante a replicação viral. Aliás, são proteínas como essa, que disparam a resposta imunológica, que recebem o título de antígenos. Então, sim: esse é um teste de antígeno, como recomendado pelo ministério.
Embora a NS1 esteja presente nos quatro sorotipos virais da dengue, os testes rápidos não são capazes de diferenciar qual causa a infecção. Na maioria dos casos, a proteína passa a ser detectável no sangue desde o primeiro dia do aparecimento dos sintomas. Ela alcança o auge por volta do terceiro dia, permanecendo rastreável até o quinto dia.
Por isso, a janela de oportunidade para realização do exame varia do primeiro ao quinto dia após o início dos sinais da infecção. O Ministério da Saúde destaca que, devido a essas características, o teste rápido para detecção de NS1 é indicado para o diagnóstico na fase aguda da doença.
Contudo, ele também apresenta limitações técnicas, como explica o médico infectologista Evaldo Stanislau de Araújo, assistente-doutor da Divisão de Moléstias Infecciosas e Parasitárias do Hospital das Clínicas de São Paulo: “Existem evidências mostrando que o teste de NS1 apresenta taxas consideráveis de resultados falso-negativos, sobretudo em regiões onde houve muita circulação de dengue no passado”.
Ou seja, a pessoa tem dengue, mas o exame diz que não.
E há ainda o teste rápido que detecta anticorpos produzidos contra a dengue – ou seja, as substâncias produzidas pelo sistema de defesa para enfrentar a infecção. Já ouviu falar nas siglas IgM? Então, ela está relacionada a uma classe de anticorpos que começa a ser produzida nos primeiros dias de sintomas.
Esses anticorpos aumentam rapidamente em 14 dias e começam a diminuir depois desse período, podendo ficar detectáveis por dois a três meses, depois de a pessoa estar curada. Pois bem: o teste rápido de anticorpos para a dengue detecta a presença dessas substâncias e, por isso, pode indicar a doença mesmo se o paciente já tiver se recuperado.
Outra limitação é que, em pessoas que já tiveram dengue antes, os níveis de IgM podem ficar mais baixos em uma eventual segunda infecção, o que levaria mais resultados falso-negativos.
Com base nessas características, é difícil saber se a infecção foi recente ou não – e está aí o motivo pelo qual o Ministério da Saúde preconiza que apenas o teste rápido que detecta antígenos NS1 seja usado para identificar a doença em fase aguda.
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Riscos de diagnósticos equivocados
A Sociedade Brasileira de Patologia Clínica e Medicina Laboratorial (SBPC/ML) destaca que seguir as diretrizes técnicas na realização dos testes é essencial para evitar possíveis erros.
“O teste rápido oferece resultados em até 30 minutos, permitindo uma resposta ágil. No entanto, sua aplicação deve ser restrita a locais autorizados, para evitar diagnósticos equivocados”, afirma Paula Távora, médica especialista em patologia clínica e medicina laboratorial, membro titular e líder do Comitê de Testes Laboratoriais Remotos e ex-presidente da SBPC/ML.
Para a realização, é preciso colher uma pequena amostra de sangue, que é colocada em uma estrutura chamada cassete. A seguir, acontece uma reação que detecta a presença ou ausência da proteína NS1.
A especialista defende que o exame deve ser feito apenas em pessoas com sintomas e em unidades de saúde. Segundo ela, quando teste rápido dá positivo, vale a pena confirmar o diagnóstico com outros exames. E, se der negativo, mas os sintomas forem muito sugestivos de dengue, o médico pode também buscar uma confirmação.
“Por isso existe a preocupação dos testes rápidos serem realizados em larga escala e sem um controle clínico-laboratorial adequado. Eles são uma oportunidade de descentralizar a assistência e auxiliar a população, mas é preciso ter cuidados”, pontua Paula.
Consultado, o Ministério da Saúde afirmou em nota que recomenda a utilização dos testes rápidos para que haja maior celeridade nos resultados dos exames. No entanto, a pasta ressalta que o método não permite identificar o sorotipo viral, informação importante para a vigilância sanitária, para o conhecimento da dinâmica da circulação dos vírus e até para o manejo dos sintomas.
“O uso de testes rápidos para diagnóstico de dengue (NS1) pode ser útil no contexto da assistência, contribuindo para a definição de conduta clínica oportuna mais adequada individualmente. Já a utilidade para vigilância em saúde é mais limitada, por não permitir identificação do sorotipo viral e pelas menores especificidades, sensibilidade e acurácia em relação às técnicas de biologia molecular”, afirmou o Ministério da Saúde, na nota.
O pasta informou, ainda, que o resultado da dengue pode ser obtido por análise do médico e dados epidemiológicos. Portanto, caso o paciente apresente sintomas e viva em uma região epidêmica, por exemplo, o profissional já pode considerar o paciente como infectado.
Não existe uma obrigatoriedade da realização de testes ou exames para fechar o diagnóstico, de acordo com o ministério.
“Os testes rápidos estão em processo de compra pelo governo. No entanto, os estados e municípios têm autonomia para a realização da compra e distribuição dos mesmos no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), que, atualmente, disponibiliza somente os insumos para diagnóstico laboratorial”, destacou o ministério.
A pedido do ministério, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) avalia a possibilidade de comercialização de autotestes para dengue. O processo está em andamento e sem previsão de conclusão.
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Corrida contra o tempo
Embora não exista um medicamento antiviral específico para a dengue, a identificação adequada é fundamental para evitar os riscos de complicações.
Os cuidados consistem principalmente na ingestão de líquidos e repouso. Nesse contexto, deve-se evitar a automedicação e monitorar a evolução do quadro.
“A letalidade da dengue é baixa, mas a doença pode ter uma evolução rápida. Nesse sentido, as pessoas morrem devido aos atrasos na identificação adequada e no início do tratamento”, diz Araújo.
Os sinais de alarme incluem dor abdominal intensa, vômitos persistentes, letargia ou irritabilidade e sangramentos. Diante de sintomas de agravamento, deve-se procurar o serviço de urgência.