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Como interpretar um estudo científico?

Em tempos de Covid-19, a metodologia das pesquisas está sob os holofotes, mas a análise de um estudo exige cautela. Que tal entender melhor esse universo?

Por Chloé Pinheiro
19 fev 2021, 13h55

Nunca se ouviu falar tanto em evidência, revisão, placebo e outros termos outrora restritos à academia. A pandemia nos aproximou da ciência e de seus bastidores, mas a interpretação dos resultados de pesquisa é um processo complexo, que exige certo conhecimento técnico e olhar crítico.

Conversamos com cientistas para desvendar um pouco destes meandros. Vamos usar como base um estudo randomizado controlado duplo cego, que é considerado o ideal para comprovar a ação de um medicamento ou vacina. Só 13% dos medicamentos ou vacinas idealizados na bancada chegam a ser aprovados para uso depois de passar pelo escrutínio dos testes.

A pergunta

estudo científico
(Ilustrações: Rodrigo Damati/SAÚDE é Vital)

A pesquisa começa com uma hipótese, isto é, uma pergunta a ser respondida e originária de experiências anteriores. Também se define o desfecho esperado, isto é, qual será a medida de sucesso da intervenção.

Os voluntários

seleção de voluntários para estudo
(Ilustrações: Rodrigo Damati/SAÚDE é Vital)

É hora de delimitar o universo do estudo, a quantidade e o perfil das pessoas que serão voluntárias: sexo, etnia, idade e se há presença de outras doenças ou não. Quanto maior e mais diversa a população, mais confiável será o resultado. Nos primeiros testes de um remédio, geralmente os participantes são adultos saudáveis. Depois, o escopo aumenta para incluir idosos, gestantes, crianças etc.

A divisão de grupos 

estudo científico
(Ilustrações: Rodrigo Damati/SAÚDE é Vital)

Os recrutados são repartidos por sorteio em dois grupos: um receberá o remédio, outro será o grupo controle — que toma um placebo (droga falsa) ou recebe o tratamento convencional para a doença. A divisão precisa ser aleatória para impedir que o pesquisador coloque alguém mais adequado no grupo da medicação, o que influenciaria os resultados a seu favor.

O cegamento 

cegamento de estudo
(Ilustrações: Rodrigo Damati/SAÚDE é Vital)

Durante um período predeterminado, os participantes tomam o remédio ou o placebo. Ninguém sabe quem está tomando o quê (nem os cientistas), pois o efeito psicológico pode mudar o comportamento da pessoa e até sua própria resposta fisiológica — há vários relatos do tipo na literatura. Se souber o que está administrando, o próprio pesquisador pode ficar sugestionado em sua avaliação.

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A análise dos achados

estudo científico
(Ilustrações: Rodrigo Damati/SAÚDE é Vital)

Findo o período de intervenção, os pesquisadores “abrem” os dados e verificam o que aconteceu nos dois grupos. Os resultados são acompanhados de um intervalo de confiança, uma espécie de margem de erro das pesquisas eleitorais, acompanhada de uma porcentagem que define a confiabilidade do dado. Quanto maior essa porcentagem (e menor a margem), melhor. A precisão do intervalo de confiança dos melhores estudos, como os das vacinas, é de 95%.

A redação do artigo

artigo científico
(Ilustrações: Rodrigo Damati/SAÚDE é Vital)

O trabalho reúne todas as informações e resultados brutos, como os dados clínicos dos voluntários ou os níveis de alguma substância no sangue. Em linhas gerais, a estrutura do texto segue a lógica: resumo (um apanhado de como o estudo foi feito e o que descobriu), introdução (que contextualiza a pesquisa), metodologia, resultados e as conclusões obtidas.

A revisão dos pares

revisão por pares de artigo científico
(Ilustrações: Rodrigo Damati/SAÚDE é Vital)

Depois de escrito, o artigo é enviado a um periódico, que é uma espécie de revista científica temática. Antes da publicação, contudo, o texto é revisado (e, se preciso, questionado) por outros cientistas que não estão envolvidos na investigação. Desconfie dos profissionais que preferem jogar discussões logo de cara para o público em geral: os resultados devem ser discutidos antes com os pares.

A publicação

artigo científico publicado
(Ilustrações: Rodrigo Damati/SAÚDE é Vital)

O periódico em que o artigo sai pesa bastante. Quanto mais reputada a revista, mais rigorosa a seleção dos artigos. Nesse contexto, existem tanto as respeitadas como as predatórias, que aceitam qualquer texto em nome do lucro — elas são usadas por pessoas mal-intencionadas para suportar conclusões duvidosas. Vale consultar o fator de impacto do periódico, medida encontrada na internet.

Outros tipos de estudo

Eles são importantes, mas, sozinhos, não comprovam a eficácia de uma terapia:

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In vitro: Provas em células isoladas para verificar o potencial da droga. Por exemplo, a capacidade de matar um vírus ou reduzir inflamação.

Observacional: É feito sem grupo controle e placebo.  Só com ele, não dá para saber se a pessoa melhorou pelo remédio ou por outro fator.

Em animais: Etapa que antecede os testes em humanos. Aqui se obtêm dados preliminares sobre eficácia e resposta do organismo ao remédio.

Pré-clínica: Abrange os ensaios que avaliam o potencial terapêutico do remédio. Primeiro em células isoladas, depois em testes com animais.

Mandamentos para analisar os resultados de um estudo

1. Leia atentamente o resumo, que conta a metodologia e os principais achados.

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2. Procure as limitações, que são descritas nas conclusões do artigo.

3. Número pequeno de pessoas avaliadas compromete a confiabilidade.

4. As conclusões de trabalhos pré-print (sem revisão) devem ser vistas com cautela.

5. Testes pré-clínicos não podem ser extrapolados para seres humanos.

6. Grandes milagres? Desconfie do santo. Na dúvida, verifique se outras pesquisas confirmam os dados do trabalho em questão.

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As etapas antes da aprovação de um medicamento

O esquema vale também para os testes com vacinas:

Pré-clínica: Abrange os ensaios que avaliam o potencial terapêutico do remédio. Primeiro em células isoladas, depois em testes com animais.

Fase 1: Algumas dezenas de voluntários recebem o composto para atestar sua segurança e observar se há efeitos colaterais graves.

Fase 2: Envolve centenas de participantes. Além da segurança, define a dose ideal e analisa a resposta do organismo à medicação.

Fase 3: Etapa final, com dezenas de milhares de indivíduos. Vê os efeitos colaterais menos comuns e atesta a eficácia da estratégia.

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Fase 4: Depois da aprovação, o monitoramento continua, em busca de efeitos a longo prazo, benefícios secundários e reações adversas raras.

Fontes: Fontes: Luiz Gustavo de Almeida, coordenador dos projetos educacionais do Instituto Questão de Ciência (IQC); Marcelo Takeshi Yamashita, diretor do Instituto de Física Teórica da Universidade Estadual Paulista (Unesp); Laura de Freitas, farmacêutica e bioquímica, doutora pela Unesp, criadora do canal Nunca Vi 1 Cientista

 

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