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Aedes aegypti: sempre ele

Entra ano, sai ano, o mosquito atormenta a saúde dos brasileiros. Depois da dengue e do zika, agora é a vez de o vírus chikungunya causar preocupação

Por André Biernath
Atualizado em 14 nov 2019, 11h05 - Publicado em 4 jan 2017, 18h08
aedes
A estratégia de inserir uma bactéria no mosquito Aedes aegypti vai ser estendida para mais cidades brasileiras (Ilustração: Marcus Penna/SAÚDE é Vital)
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No Norte e no Centro-Oeste, depósitos de lixo são os locais onde as fêmeas do mosquito Aedes aegypti mais depositam seus ovos. Nas regiões Nordeste e Sul, o maior foco de procriação do inseto são tonéis e caixas-d’água. E, no Sudeste, ele se reproduz principalmente em vasos de planta, garrafas e calhas. O problema disso, claro, é que esse bichinho carrega os vírus da dengue, do zika e do chikungunya. Veja um raio-x de cada um desses problemas:

 

Chikungunya

Disseminação do chikugunya
O vírus já se espalhou pelo norte e agora ameaça as regiões Centro-Oeste e Sudeste (Ilustração: Marcus Penna)

Ele é a bola da vez: segundo dados do Ministério da Saúde, o chikungunya esteve por trás de 251 mil casos em 2016 e superou o zika, que atingiu 208 mil indivíduos. E olha que os especialistas esperam um crescimento nos próximos meses.

“No verão passado estive em Sergipe e confesso que fiquei impressionado com a quantidade de infectados e o impacto que a doença traz à vida deles”, conta o virologista Paolo Zanotto, do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (USP). O aumento deve acontecer nas regiões Centro-Oeste e Sudeste do Brasil, onde o vírus ainda não se espalhou com força e a população está vulnerável.

Entrevista: Chikungunya é mais mortal do que a dengue?

No Norte e no Nordeste, uma boa parcela do povo já teve algum contato com o agente infeccioso e, portanto, desenvolveu uma resposta imunológica contra ele. Os sintomas clássicos são febre alta de início repentino, manchas na pele e dores nas juntas. Esta última manifestação, aliás, gera alarde porque pode se perpetuar após o quadro.

O nome chikungunya vem do suaíli, um dos idiomas da Tanzânia, local onde foi descrito pela primeira vez, e significa literalmente “aqueles que se dobram”. O termo retrata a posição em que os pacientes ficam em decorrência dos incômodos articulares. Em 20% dos episódios, a dor se torna crônica e permanece por meses ou anos sem trégua.

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“E ela acomete justamente as partes que o sujeito utiliza no dia a dia, como mãos, joelhos e cotovelos”, observa o infectologista Celso Granato, do Fleury Medicina e Saúde, em São Paulo. A questão é que os médicos não têm ideia de como aliviar a deterioração das juntas.

Para tentar responder a algumas das dúvidas, a Sociedade Brasileira de Reumatologia está elaborando o primeiro documento com as orientações de tratamento do problema. “Reunimos um grupo de 30 profissionais de saúde de diferentes especialidades e analisamos mais de 170 artigos científicos para escrever as recomendações, que vão ser publicadas em breve”, conta o reumatologista Georges Basile Christopoulos, presidente da entidade.

A proposta é recorrer a um esquema terapêutico similar ao empregado no combate à artrite reumatoide, desordem autoimune que também inflama as dobradiças do corpo. “Nós vamos conversar com o Ministério da Saúde para oferecer cursos de capacitação aos médicos do atendimento básico, uma vez que não temos contingente para absorver toda a demanda que virá”, detalha Christopoulos. Diante de febre súbita e sensação dolorosa nas juntas, procure o hospital. Remédios, água e repouso absoluto podem evitar complicações futuras.

Como o vírus compromete as articulações?

Teoria 1
Experiências detectaram exemplares do chikungunya dentro das articulações, o que indica uma ação direta nessas estruturas. O prejuízo seria maior à membrana sinovial, uma película que protege as juntas e permite que elas dobrem corretamente.

Teoria 2
A presença do vírus faz as células de defesa ficarem muito ativadas. Elas atuam com o objetivo de neutralizar a invasão. Devido ao excesso de estímulo, as unidades do sistema imune passam a atacar e a inflamar as articulações.

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Zika

Nenhum outro tema de saúde ganhou tanto destaque em 2016 quanto o zika vírus. Não pela doença em si, que na maioria dos casos nem sintoma dá. O drama são suas consequências nefastas: a síndrome de Guillain-Barré e, principalmente, a microcefalia (leia mais à direita). E pensar que, há três anos, a ciência nem suspeitava dessa relação…

“A cada dia nos deparamos com coisas novas, como o fato de que pessoas com o vírus reportam dores abdominais e diarreia”,
exemplifica o médico Antonio Carlos Bandeira, da Sociedade Brasileira de Infectologia. Agora, estudos começam a relatar uma espécie de microcefalia adquirida, quando a criança nasce com uma cabeça de tamanho saudável, mas que para de crescer aos 4 ou 5 meses.

“Essa é outra faceta grave do zika que não conhecíamos e com a qual precisaremos lidar”, constata a neuropediatra Silvana Frizzo, do Hospital Infantil Sabará, em São Paulo. Enquanto uma vacina não vira realidade, resta aos casais planejarem a gravidez e às gestantes capricharem nos repelentes.

Os efeitos mais gravez dessa infecção

Microcefalia: o zika tem uma preferência por invadir neurônios e as demais células do sistema nervoso que estão em formação. Isso empaca o desenvolvimento cerebral do bebê na gestação e nos primeiros meses de vida. Mais de 2 100 casos de microcefalia foram confirmados em 725 cidades.
Guillain-Barré: O vírus interfere no funcionamento do sistema imune, que passa a atacar nervos periféricos do organismo. O resultado disso é dor e perda de sensibilidade em músculos de braços, pernas e até do sistema respiratório. 100% foi quanto a incidência da síndrome subiu no Nordeste durante a época com mais relatos de zika.

Dengue

Velha conhecida dos verões dos últimos 30 anos, a dengue causará um estrago um pouco menor em 2017. Mas nada do que se orgulhar: isso se deve ao fato de que 2015 e 2016 bateram todos os recordes históricos.

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Além disso, como o mesmo tipo de vírus do ano passado vai estar ativo agora (há quatro tipos diferentes de dengue), a tendência é que a taxa de infecções seja mais baixa. A boa-nova é que finalmente temos uma vacina já aprovada e disponível no país. Fabricada pelo laboratório francês Sanofi Pasteur, carece de três doses e confere uma proteção de 66%.

Ela parece ser particularmente bem-vinda para diminuir o risco de internações e complicações nos quadros graves. Por ora, o imunizante só está na rede privada. “Ele foi inserido num programa público de vacinação de 30 municípios do Paraná com alta incidência de casos”, destaca Sheila Homsani, diretora médica da farmacêutica. A primeira dose foi aplicada em setembro e outubro e a segunda está prevista para o mês de março.

Outra candidata fortíssima é desenvolvida pelo Instituto Butantan, em São Paulo. A versão nacional precisa de apenas uma dose e promete ter uma eficácia superior a 90%. “As pesquisas finais estão em andamento em 14 centros de todo o país e envolverão 17 mil voluntários”, estima o imunologista Jorge Kalil, diretor do instituto.

Até o final de novembro, 4 mil pessoas foram imunizadas, mas a expectativa é que o número aumente nos próximos meses. Com bons resultados em mãos, a vacina será submetida às agências regulatórias dentro de dois anos.

Em 2016, o Brasil teve uma taxa de 713 casos de dengue por 100 mil habitantes. Nesse período, foram 803 infecções graves
e 601 mortes pelo país.

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Outros vírus propagados pelo Aedes

Além de chikungunya, zika e dengue, existem outros 65 vírus que são transmitidos pela picada do Aedes aegypti e de seus parentes. Mas o que influencia sua propagação em um determinado lugar? Ninguém sabe.

“Vários fatores estão envolvidos nesse processo, como as mudanças climáticas e a urbanização, mas a ciência não consegue prever com exatidão qual vai ser a epidemia seguinte”, esclarece Granato. As febres do mayaro, do Nilo Ocidental e a amarela urbana, que assolam o continente africano, tiraram o sono dos especialistas mundo afora.

Mas o máximo que pode ser feito para evitar que elas se difundam é um bom controle sanitário das fronteiras, ficar atento a sintomas e notificar autoridades. “Não adianta pensar nelas agora. O risco de surgirem por aqui não é grande”, afirma o infectologista Marcos Boulos, da Faculdade de Medicina da USP. Pois é, nada de alarmismo ou sofrer por antecipação… “As três doenças que circulam no momento são mais do que suficientes para nos preocuparmos”, diz Boulos.

Febre amarela urbana: marcada por náusea e dor de cabeça, ela está erradicada no Brasil desde a década de 1940. Mas um surto em Angola se espalhou para Congo, Quênia e China e ligou o sinal de alerta entre as autoridades internacionais.

Febre do Mayaro: quase 200 casos foram comunicados no Norte e no Centro-Oeste do Brasil. Febre, cansaço e incômodo nas juntas são parecidos aos do chikungunya — é possível que as duas condições sejam confundidas por aí.

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Febre do Nilo Ocidental: não há relatos recentes da presença do vírus por trás dessa enfermidade no nosso país. Ele ataca o sistema nervoso central e provoca uma inflamação no cérebro. É bem perigosa em idades avançadas.

Como o governo, a ciência e a sociedade podem atuar contra o Aedes aegypti

Governo: investir em saneamento básico e na limpeza de rios e córregos. Realizar campanhas de conscientização e educação o ano todo. Limpar terrenos baldios, vielas, bueiros e lixões.

Ciência: soltar mosquitos transgênicos que não transmitem os vírus. Estudar a Wolbachia, bactéria que inativa a transmissão do vírus. Criar vacinas seguras e efetivas para dengue, zika e chikungunya.

População: Eliminar criadouros dentro de casa,  como vasos, garrafas e pneus. Orientar os vizinhos a acabar com depósitos d’água desprotegidos. Usar repelentes e instalar telas protetoras em portas e janelas.

 

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