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Saúde com Diversidade

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A enfermeira especialista em educação Jussara Otaviano, embaixadora do Prêmio de Enfermagem Rainha Silvia da Suécia, discute a importância de valorizar a diversidade e o tamanho dos impactos da desigualdade no acesso à saúde
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Os estados de violência a que a nossa juventude está exposta

Nossa colunista assina artigo em parceria com o médico de família indígena Walter Costa Shiota sobre os impactos sociais e psíquicos da violência estrutural

Por Jussara Otaviano e Walter Costa Shiota*
9 out 2023, 15h23
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Menos rede de apoio e assistência do Estado: fator que expõe os mais novos a problemas sociais e psíquicos.  (Foto: Sharif Souav/ Unsplash/Divulgação)
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A saúde não é apenas um fragmento solto na pilha de uma ausência de doenças. É, sobretudo, um contexto com múltiplos aspectos que nos envolvem como seres humanos.

Não é à toa que lá em 1978 a Organização Mundial da Saúde (OMS) já sinalizava esse olhar ampliado sobre o tema, naquela famosa Declaração de Alma-Ata, quando estendeu o entendimento de que saudável seremos quando estivermos contemplados por um conjunto de fatores que agregam valores positivos ao cotidiano, ao nosso viver bem: educação, lazer, cultura, segurança, emprego, acesso à saúde, igualdade social, espiritualidade, família, dentre tantos outros.

Então olhar a saúde é enxergar o todo; não somente o corpo; mas também a mente, o sofrimento, a vivência do outro. O sofrimento se manifesta de diversas maneiras, alguns até codificados por nós, profissionais de saúde; códigos esses que claramente não exprimem a intensidade das dores e das lágrimas e do outro.

Esse sofrimento pintado na tela das peles e das almas manifesta-se de diversas maneiras. Naquele pedido de ajuda em forma de dor de cabeça, dor no braço, dor de barriga ou apenas o silêncio de um olhar perdido na multidão.

A pandemia nos trouxe várias lições. E não mediu esforços em nos evidenciar que esse tal sofrimento não compactua com desigualdades sociais. Ele é universal, está aí estampado em todas as classes sociais, sem gênero, raça, cor, escolaridade.

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+ Leia tambémAntes do suicídio: o que dizer e o não dizer para alguém em risco

E, quando pensamos em adolescentes, principalmente aqueles da periferia, já marginalizados por nossa famigerada iniquidade social, assim como os negros, indígenas e a população LGBTQIA+, visualizamos ainda mais a necessidade de entender a necessidade da escuta qualificada; de abrir e criar portas para ouvir os sofrimentos (que não são poucos).

Nos dias ensolarados da primavera, passando por Setembro Amarelo, Outubro Rosa e Novembro Azul, o brilho das cores nos chama a atenção para pensar paradoxalmente na opacidade daqueles que perdem a luz da vontade de viver. Daqueles que perdem essa luz tão cedo.

Dados da Secretária Municipal de Saúde da cidade de São Paulo mostram que a quarta causa de mortes entre jovens hoje é o suicídio. De todas as notificações de autoagressividade, cerca de 67% são de pessoas de 10 a 29 anos, com aumento significativo entre 2016 e 2002 (de 5% para 23%), principalmente entre mulheres.

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Se filtrarmos ainda mais essa lupa, veremos que grande parte da questão reside ali na marginalização da comunidade, da sociedade como um todo. É preciso urgentemente reconectarmos com nossos jovens. É preciso que os profissionais de saúde, e toda a sociedade, recuperem vínculos de afetividade perdidas nas rotinas para enxergarmos para além das necessidades básicas de sobrevivência.

É extremamente relevante ter em mente que o suicídio brota da violência, e é um fenômeno humano, deliberado, complexo, multifatorial e EVITÁVEL.

Os estados de violência impactam o funcionamento global do indivíduo e no funcionamento da sociedade e do próprio sistema de saúde criado para ampará-la. Portanto, é crítico rever, dentro do âmbito do SUS, o potencial Estratégia Saúde da Família e valorizá-la novamente como esse eixo, esse elo do cuidado centrado nas pessoas.

Urge olhar para a potencialidade das comunidades, das famílias, das pessoas, das amizades verdadeiras.

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Pois é ali nas quebradas das periferias, nas rampas de skate, nas rodas de conversas, nas ONGs, nos bailes funks, e também nas universidades, nos centros acadêmicos, nas quadras de esporte que a voz ativa do adolescente precisa ser ouvida e ganhar protagonismo. Só assim poderemos acolher suas reais necessidades e cortar o fio guia do sofrimento ligado aos estados de violência.

+ Leia também: Juventude brasileira está mais exposta a hábitos pouco saudáveis

Sensível ao outro

Precisamos estar atentos, disponíveis e sensíveis aos outros. São diversos os fatores que alavancam os estados de violência entre os jovens. A disparidade social e a falta de recursos financeiros e oportunidades na periferia urbana, nas aldeias indígenas e nas comunidades quilombolas e ribeirinhas podem levar a sentimentos de desesperança e falta de perspectiva de futuro, empurrando os adolescentes para o alcoolismo e para as drogas.

A exposição frequente à violência (em qualquer de suas formas) e à criminalidade predominante nas grandes capitais pode causar traumas psicológicos. Os conflitos, os abusos, as negligências, as violências intrapessoais domésticas, somadas à falta de redes de apoio efetivas e solidárias, produzem solidão e isolamento social e emocional.

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Da mesma forma, a pressão e as expectativas excessivas para alcançar o sucesso (nos estudos, na carreira, na vida…) levam ao estresse e à ansiedade, ainda mais em contextos de adversidade. A discriminação racial e de gênero, por sua vez, abre caminho a sentimentos de desvalorização, baixa autoestima, entre outras repercussões.

Tudo isso se torna ainda mais complicado quando os jovens têm acesso a meios letais, como armas de fogo, por trás de acidentes e episódios violentos.

O rapper Emicida, em sua música Amarelo, faz uma bela referência à juventude periférica que se estende a todas as outras formas de juventude.

“Permita que eu fale não às minhas cicatrizes. Se isso é sobrevivência e resumir a sobrevivência é roubar o pouco de bom que vivi. Permita que eu fale não às minhas cicatrizes. Achar que essas mazelas me definem é o pior dos crimes. É dar o troféu pro nosso algoz e fazer nós sumir…”

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A falta de conscientização e educação sobre saúde mental, bem como o estigma, pode impedir que a juventude reconheça seus próprios problemas e busque ajuda apropriada.

Para abordar os estados de violência na juventude, é crucial programarmos estratégias de promoção e prevenção que incluam o cuidado emocional e comportamental, o acesso a serviços de saúde, o apoio familiar e comunitário e as medidas coletivas para abordar questões sociais e econômicas subjacentes.

É necessário também lembrar que maioria de nossos jovem frequenta espaços coletivos, com destaque para as escolas. E as escolas têm um papel importante para além da aprendizagem curricular básica. Elas podem trazer à consciência e ao debate temas como a sociedade de consumo, a mercantilização dos corpos e da sexualidade, dos impactos ambientais e da relação disso tudo com os estados de violência.

A pauta é urgente, e cabe notar que não existe uma solução única. Enfrentar a violência (inclusive a autoinfligida) entre os jovens pressupõe uma abordagem multiprofissional e intersetorial. Depende do envolvimento de governos, instituições de saúde e ensino, ONGs, sociedade civil…

É imperativo nos juntarmos para encarar esse desafio de saúde pública e construir uma nova ordem social em cima de ambientes de paz, mais seguros e saudáveis.

*Walter Costa Shiota é médico de família que atua desde os anos 2000 em uma região periférica no extremo sul da cidade de São Paulo. É docente no Centro Universitário São Camilo 

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