Estamos envelhecendo. O progresso da medicina, associado à melhoria das condições de saneamento e saúde, tem permitido uma expectativa de vida mais elevada e um aumento considerável na população acima de 60 anos. Em paralelo, a incidência das doenças crônicas não transmissíveis vem aumentando progressivamente, sendo hoje a principal causa de morte no país. Essa mudança do perfil epidemiológico exige uma mudança no modelo assistencial oferecido e na filosofia desse cuidado – com uma tônica maior na qualidade de vida do indivíduo e do núcleo familiar ao seu entorno.
O modelo atual foi formatado sob o foco da doença, com a especialização de serviços médicos e hospitais no tratamento cada vez mais preciso, intensivo e agressivo. A questão é que, muitas vezes, o idoso apresenta mais de uma doença, e o tratamento disponível não garante a plena recuperação a um estado de bem-estar, capacidade funcional e interação com as pessoas próximas. Como lidar com isso? O que é certo? O que é direito?
A Organização Mundial da Saúde (OMS) define o cuidado paliativo como uma abordagem voltada para a melhoria da qualidade de vida de pessoas com doenças ameaçadoras à vida. Esse modelo envolve não só cuidar dos sintomas físicos da doença mas também oferecer apoio emocional e social aos pacientes e à família.
Mais do que isso, busca atender as necessidades específicas e preferências individuais, introduzindo o elemento da escolha. Pacientes e seus familiares têm o direito de decidir a forma e os limites de seu tratamento. O binômio médico-paciente tradicional evolui para uma tríade envolvendo paciente, família e time de saúde com vários profissionais (médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, psicólogos, assistentes sociais, nutricionistas…), acordando o que seria o melhor para aliviar o sofrimento e respeitar a dignidade da pessoa.
O desconhecimento da abordagem paliativa é apontado pela própria OMS como um dos principais entraves a essa proposta. Cerca de 40 milhões de pessoas no mundo requerem esse tipo de assistência, que é ofertada a apenas 14% desse total. O cuidado paliativo deve ser oferecido o mais precocemente possível no curso de uma doença.
Preparar a família, controlar os sintomas e prestar apoio melhoram a qualidade de vida e reduzem a utilização de serviços médico-hospitalares desnecessários. Precisamos ter coragem de perguntar o que faz sentido. Por que prolongar o sofrimento de quem já não está inteiro entre nós?
*Dr. Carlos Alberto Chiesa é médico e diretor-presidente do Hospital Placi, no Rio de Janeiro