“Prefiro participar de eventos com alunos do que com professores, por isso aceitei seu convite”, disse Sir Richard Roberts quando perguntei ao Prêmio Nobel de Medicina por que aceitou vir ao Rio de Janeiro para estar com os jovens na Academia Nacional de Medicina, em julho, por ocasião da reunião do G20 no país.
A razão de tal predileção? Segundo ele, certa ingenuidade dos jovens, capazes de fazer perguntas que, algumas vezes, são tachadas como elementares. De fato, frequentemente aceitamos uma informação sem crítica, porém, quando refletimos com mais calma, não sabemos a razão de determinada resposta.
A habilidade de fazer perguntas sobre qualquer tópico, a curiosidade e a paixão são o que movem os cientistas, os novatos e os experientes. Se por um lado, ganhar um Prêmio Nobel – talvez a maior honraria do meio acadêmico – é acompanhado de cerimônias pomposas e muda para sempre a vida do laureado, por outro a realidade do cotidiano dos jovens pesquisadores brasileiros costuma ser bastante diferente.
A trilha para publicação científica é espinhosa e cheia de meandros. Não bastasse o esforço hercúleo para produzir um trabalho de qualidade em um ambiente com subfinanciamento – com muitos mais erros que acertos pelo caminho –, os preços praticados pelos periódicos são altos, principalmente para publicar o artigo como livre acesso pelos leitores.
Após divulgado, o direito autoral passa a ser do jornal, o que é controverso. Fica o questionamento para quem realmente é o acesso aberto.
Essa “máquina” das publicações científicas é alimentada pelo fato de que, a fim de progredir na carreira acadêmica em nossas universidades, a quantidade de artigos por vezes é mais valorizada que sua qualidade. Periódicos predatórios se multiplicam. Publicar por publicar parece não ser razoável.
A nova geração de cientistas, em meio a esses e outros desafios, desiste. Outras carreiras mostram-se mais atrativas. Documento da CAPES, a partir de registros da Plataforma Sucupira, mostrou queda na procura de posições de pós-graduação. Em 2020, 1 em cada 4 vagas de doutorado estavam ociosas.
Precisamos urgentemente de bons mentores e, mais que isso, de patrocinadores (os sponsors), figura ainda mais rara no começo da carreira por aqui.
O professor Roberts, que é um biólogo britânico, descobriu os íntrons de RNA, isto é, regiões que, apesar de não conterem as informações necessárias para sintetizar uma proteína, são capazes de alterar sua expressão genética.
Analogamente, assim como no RNA, muitas são as peças capazes de alterar o cenário que passam despercebidas. Precisamos de profissionais de referência que estejam dispostos a ensinar esses bastidores, a navegar conosco nessa política intrínseca ao processo. Ser competente não implica ser bem-sucedido.
Nessa toada, bolsas e programas focados em cientistas em início de carreira, capazes de aumentar o acesso e a diversidade seja em agências de fomento ou universidades, seja em empresas, devem ser celebrados e incentivados. A ciência não é um fim, mas um meio para melhorar a sociedade.
Devemos, nesse sentido, fomentar a transdiciplinaridade e a ciência de aplicação, voltada para resolver problemas reais, e não apenas para adicionar uma linha no currículo de seu autor.
Sim, precisamos deixar os jovens cientistas sob holofotes. O G20 no Brasil é uma excelente oportunidade para reforçar esse movimento.
As gerações mais novas estão realizando projetos extraordinários com potencial de impactar a sociedade em todo o mundo. No entanto, elas têm de se conectar, colaborar, receber mais investimentos e serem mais ouvidas pela imprensa e pelos governos. “Speak up!”
* Gustavo Rosa Gameiro é médico e cientista, doutorando em oftalmologia pela Universidade de São Paulo (Unifesp)