Nós, brasileiros, estávamos tão acostumados a lidar com a dengue que mal percebemos um novo inimigo à espreita. Seu nome é chikungunya, ou “aquele que se dobra”, em referência à dor debilitante causada pela doença. A palavra vem do idioma local da Tanzânia, onde o vírus foi identificado pela primeira vez. Mas ele não ficou por lá.
Em 2014, ele pegou carona no mosquito Aedes aegypti e alugou um espaço em nosso “condomínio Brasil”.
Mas ele não é um inquilino educado. Em 2017, fez uma festa de arromba, no Ceará, causando uma das maiores epidemias de chikungunya do país. Nesta ocasião, infectou mais de 70 mil pessoas e mostrou a que veio.
O vírus causa febre, dor de cabeça e, principalmente, dores nas articulações, além de ter uma letalidade maior que a dengue.
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Por onde passa, o chikungunya deixa um lembrete da sua estadia: em mais da metade dos casos, as dores nas articulações não somem e incapacitam por pelo menos 3 meses, levando a afastamentos do trabalho e a uma redução drástica da qualidade de vida.
Ou seja, ninguém quer esse hóspede por perto. Mesmo assim, aproveitando-se da disseminação do Aedes pelas cidades, o chikungunya já causa epidemias anuais e assinou um contrato de aluguel sem data para expirar.
Em 2023, até maio, já eram 80 mil casos pelo Brasil, número maior do que no mesmo período de 2022.
As soluções para o despejo
O cenário é preocupante, mas nem tudo está perdido. Em junho deste ano, foram publicados os resultados parciais da última fase de testes de uma vacina contra chikungunya.
Trata-se da VLA1553, vacina de dose única que usa o vírus enfraquecido para estimular a resposta imune. Até agora, o estudo, com cerca de 4000 participantes, demonstrou que a vacina produz anticorpos, sem efeitos colaterais graves.
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Apesar de ser produzida por uma farmacêutica francesa, brasileiros podem comemorar. A empresa Valneva, dona da fórmula, tem parceria com o Instituto Butantan.
É uma sinalização de que, caso a vacina seja eficaz, trazê-la para o SUS será mais fácil, já que colaboramos com as pesquisas.
Prevenção da chikungunya
Até que haja uma solução efetiva contra o vírus devemos ficar atentos especialmente entre fevereiro e julho, quando é esperado que os casos da doença aumentem. Além da atenção aos sintomas, é necessário reforçar a prevenção.
Mantenha comorbidades como diabetes, hipertensão e doenças cardíacas sob controle. Elas aumentam o risco de chikungunya grave. Cuide para não deixar água parada e reforce o uso de repelente caso veja muitos mosquitos.
E acima de tudo, cobre das autoridades sanitárias o controle do mosquito e a divulgação do número de casos na sua cidade.
No Olá, Ciência!, canal de divulgação científica no YouTube, revelamos como nossos gestores estão negligenciando essas informações na nossa série de vídeos “Soluções para o Brasil”. E o resultado disso nós já sabemos.
O chikungunya chegou para ficar. Mas conhecer o inimigo e saber dos seus perigos é o primeiro passo para superá-lo. Vamos deixar esse inquilino indesejado mandar no condomínio ou vamos nos organizar para expulsá-lo de vez?
*Lucas Zanandrez é biomédico e mestre em Inovação Tecnológica e Propriedade Intelectual pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). É diretor e comunicador científico na Olá, Ciência!, produtora de conteúdo audiovisual com foco em saúde e divulgação científica.