A coordenação do cuidado é uma ferramenta da medicina que auxilia os pacientes a navegar pelo sistema de saúde de forma mais eficaz e eficiente, de acordo com as suas necessidades clínicas e em sintonia com a evolução do conhecimento sobre doenças crônicas e as diversas formas de prevenção.
Diante da mudança no perfil demográfico e epidemiológico da população, sujeita a enfermidades que se desenvolvem ao longo do tempo e podem ser evitadas ou amenizadas por diagnósticos precoces, não faz mais sentido insistir em um modelo de oferta de tratamento focado quase que exclusivamente em situações críticas ou quadros agudos, adotado pela saúde suplementar no século passado.
Nesse contexto, ganha importância o acompanhamento constante dos usuários dos planos de saúde por médicos da família, com o compartilhamento de prontuários, históricos e exames, quando realmente for preciso encaminhá-los a especialistas. A gestão integrada de recursos e informações economiza tempo, evita desperdícios e proporciona um entendimento da saúde global do paciente, que não pode mais ser tratado de forma fragmentada.
De acordo com pesquisa recente do Conselho Federal de Medicina (CFM), o número de profissionais dedicados à Medicina da Família e Comunidade cresceu, no Brasil, 30% em dois anos e 171% na última década. Esses índices têm correspondência com os investimentos em atenção primária (o atendimento inicial dos pacientes) feitos pelos planos de saúde e healthtechs. A mesma pesquisa aponta que 80% dos casos dos pacientes podem ser solucionados por esse tipo de atendimento, evitando hospitalizações e exames desnecessários.
O modelo baseado na atenção primária concentra-se no cuidado ao longo da vida e não quando o paciente já está em uma fase aguda. Assim, o médico da família e comunidade é protagonista da manutenção da saúde e do bem-estar. Diante do melhor uso da rede assistencial, os beneficiários e toda a cadeia produtiva ganham com a otimização de exames e procedimentos.
O médico da família é mais do que aquele profissional que acompanha o paciente em todas as fases da vida: trata-se de um especialista em pessoas, pois possui um amplo conjunto de informações, que vão muito além dos dados exigidos para um prontuário comum.
Assim, conhece as emoções, a rotina, as dificuldades e os sonhos de cada um, com capacidade para fazer uma avaliação mais aprofundada do quadro clínico, que nem sempre requer o direcionamento para especialistas. Por manter um acompanhamento frequente, ele mesmo pode pedir exames ou apontar tratamentos de diferentes especialidades pela vasta compreensão que tem de seu paciente.
No entanto, isso não exclui o direcionamento e o trabalho em parceria com especialistas. A diferença é que, com o acompanhamento do médico da família, as pessoas são orientadas a procurá-los em situações mais complexas. A partir da necessidade de encaminhamento, os profissionais trocam informações para a realização de exames e a escolha do tratamento mais indicado para o caso em questão.
Atualmente, com base em dados divulgados pela plataforma de inovação aberta Distrito, há 747 healthtechs no Brasil. Parte delas vem investindo na oferta de atendimento primário digital a partir do médico de família e comunidade, reflexo de como a transformação digital das empresas e da sociedade tem impactado a medicina.
Segundo a Abramge (Associação Brasileira de Planos de Saúde), desde abril de 2020, foram feitas mais de 3 milhões de teleconsultas entre as operadoras filiadas, que atendem quase 9 milhões de beneficiários no país. Pode-se dizer que o sucesso da telessaúde impulsionou não apenas o modelo de atendimento focado na atenção primária, mas também o comportamento das pessoas quanto à adoção da saúde digital.
A chegada iminente da internet 5G, aliada à Internet das Coisas (IoT) e à inteligência artificial, resultará em um salto na digitalização da saúde, com a integração de dispositivos e máquinas. Haverá maior armazenamento de dados em nuvem, mais velocidade na transmissão desses registros e eficiência no cruzamento de informações para a definição de protocolos de tratamento ainda mais precisos.
Esse movimento também impactará o setor de medicina diagnóstica a partir da realização de exames inovadores, como aqueles via telecomando, em que uma equipe opera o aparelho remotamente e especialistas trabalham no laudo e pós-laudo. Tais avanços tornarão factível a chamada Medicina 4P (preditiva, preventiva, personalizada e participativa) em um curto espaço de tempo.
As operadoras de planos de saúde caminham para esse futuro cada vez mais próximo. O envolvimento dos médicos nesse processo é fundamental para facilitar o acesso aos beneficiários e lhes proporcionar um tratamento mais completo, eficiente e humanitário.
* Renato Casarotti é presidente da Abramge (Associação Brasileira de Planos de Saúde)