A vacina vem aí
Depois de quase um século de esforços, um imunizante inédito contra o vírus desembarca no Brasil
De acordo com o Ministério da Saúde, só em 2015 a dengue ultrapassou 1,4 milhão de infectados e provocou 761 mortes. Mas algumas coisas, ainda bem, evoluíram de lá pra cá: se no início do século passado as vacinas eram motivo de revolta, hoje são a grande esperança de controle da epidemia. E a ciência está muito perto de entregar o primeiro imunizante efetivo para a dengue, fruto de um trabalho que envolve farmacêuticas e universidades há mais de oito décadas.
A candidata a vacina mais próxima da realidade vem do laboratório francês Sanofi Pasteur. A fórmula foi testada em mais de 40 mil pessoas espalhadas em 15 países do globo e os resultados da intervenção, publicados no respeitado periódico The New England Journal of Medicine.
Nos voluntários com idade superior a 9 anos, o imunizante teve uma eficácia de 66%. Em outras palavras, de cada mil pessoas vacinadas, 660 escaparam da doença. “Além disso, observamos uma redução de 93% dos quadros graves e uma queda de 80% das hospitalizações, o que é bastante significativo”, relata Sheila Homsani, diretora-médica da empresa.
Resultados animadores levaram a Sanofi a acertar a papelada e pedir a liberação do produto na Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a Anvisa. E o órgão regulatório acaba de autorizar seu uso em território nacional. Atualmente, o México já liberou seu uso e outras várias nações discutem a aprovação. O laboratório, inclusive, já se antecipou e montou uma fábrica na França exclusiva para atender esse mercado. A unidade teria a capacidade de produzir 100 milhões de doses por ano.
A vacina deverá ser indicada a todos os indivíduos com mais de 9 anos. Antes dessa idade, as porcentagens de sucesso não foram das melhores. “Não sabemos qual a razão disso, mas provavelmente a falta de maturidade tenha alguma influência”, especula Sheila. Para obter a proteção, são necessárias três picadas, com um intervalo de seis meses entre elas. Também não está claro se será necessário tomar doses de reforço de tempos em tempos, como acontece com a vacina para o tétano, por exemplo.
O produto da Sanofi é feito a partir do vírus atenuado da febre amarela, aquele que causou o maio zum-zum-zum no Rio de 1900 e bolinha. Após modificações em seu DNA, ele passa a ser reconhecido no organismo como um exemplar da dengue. Apesar dos avanços notáveis, a liberação iminente do produto ainda é motivo de bastante discussão entre os experts. Uma das principais críticas é o fato de sua eficácia ficar na casa dos 65%, considerada baixa perto de outros imunizantes, que ultrapassam com relativa facilidade os 95% de resguardo. “Essa não é a vacina dos sonhos, mas é melhor do que não ter nenhuma opção”, analisa Carolina Larazi, do Fleury Medicina e Saúde.