Uso de IA por médicos pode diminuir habilidade de detectar câncer, diz estudo
Pesquisa sugere que assistência de rotina com inteligência artificial pode levar à perda de habilidades em médicos que realizam o procedimento

A inteligência artificial (IA) é considerada uma revolução na área da saúde, e já ajuda a interpretar e organizar dados, reduz filas de espera, otimiza atendimentos, participa da pesquisa de novos medicamentos e facilita diagnósticos.
Quando o assunto é oncologia, não é diferente. Estudos sugerem que a assistência da ferramenta pode ser útil no apoio da detecção de alguns tipos de câncer ao analisar com mais precisão achados de exames. Parece muito promissor, mas a ciência segue dando seus passos em busca de novas evidências.
Um novo estudo, publicado nessa terça-feira, 12, na revista científica Lancet Gastroenterology & Hepatology, aponta que a implementação da IA na rotina hospitalar pode levar à diminuição da capacidade dos profissionais médicos, com impactos para o quadro clínico dos pacientes.
A pesquisa observacional considerou 1 400 colonoscopias realizadas após a introdução da IA em diferentes instituições como apoio ao diagnóstico. Meses após a implementação da tecnologia, a taxa de detecção de sinais pré-cancerosos no cólon por profissionais de saúde experientes em colonoscopias diminuiu 20% (variando de 28,4% a 22,4%) quando não assistidos por IA.
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O médico colonoscopista Mauro Picolo, do Centro Especializado em Aparelho Digestivo do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, considera inevitável que a inteligência artificial chegue aos exames endoscópicos. E avalia que o novo artigo não traz evidências de um retrocesso.
“Esse estudo mostrou que, quando usa a tecnologia da IA, o médico é capaz de detectar mais pólipos, ou seja, fica mais eficaz. E, quando privado dessa tecnologia, o profissional costuma encontrar menos pólipos, perdendo um pouco a eficiência. No meu entendimento, não é caminhar para trás”, diz Picolo.
Os próprios autores ressaltam que o trabalho apresenta limitações devido à natureza observacional do estudo. Análises complementares são necessárias para elucidar de que maneira a IA pode afetar a habilidade dos especialistas.
“Esse tipo de análise observacional traz alguns pontos criticáveis, como utilizar apenas um único tipo de programa de IA. Outro ponto é que é um estudo multicêntrico, então os serviços podem ter tido diferenças na seleção de pacientes e no perfil dos profissionais”, pontua Picolo.
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A avaliação englobou quatro centros de colonoscopia na Polônia, entre setembro de 2021 e março de 2022. O uso regular da ferramenta de inteligência foi introduzido nas unidades no final de 2021. Após esse período, o procedimento continuou sendo feito aleatoriamente com ou sem assistência de IA.
No recorte de tempo estudado, as colonoscopias foram realizadas por 19 endoscopistas experientes, que, realizaram mais de 2 000 colonoscopias cada, ao longo do tempo.
“Até onde sabemos, este é o primeiro estudo a sugerir um impacto negativo do uso regular de IA na capacidade dos profissionais de saúde de realizar uma tarefa relevante para o paciente em qualquer tipo de medicina. Nossos resultados são preocupantes, visto que a adoção da IA na medicina está se espalhando rapidamente”, afirma um dos autores do estudo, Marcin Romańczyk, da Academia da Silésia, da Polônia, em nota.
Em um momento de aumento no número de casos de câncer de intestino, doença que tem afetado também pessoas com menos de 50 anos, a precisão da colonoscopia se faz fundamental.
A partir da técnica, endoscopistas podem identificar e remover tumores benignos, chamados adenomas, prevenindo o desenvolvimento do câncer de cólon e reto no futuro.