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Cinema: um olhar feminino sobre o cuidado amoroso na esclerose múltipla

Curta-metragem Esclerosada Não é a Vó traz uma perspectiva única sobre mulheres tocadas pela esclerose múltipla. Uma das diretoras revela sua história

Por Erenice de Oliveira, jornalista e diretora de Esclerosada Não é a Avó*
3 ago 2022, 10h19

Convido o leitor a acompanhar meu percurso dentro do projeto cinematográfico Esclerosada Não é a Vó apartir de uma reflexão. Qual o sentido de cuidar? No dicionário, é curar, doar, prevenir. Eu acrescentaria adaptar, pois são inúmeras as vezes que a vida requer ajustes para seguirmos com as atividades diárias. 

Historicamente, em várias civilizações, é feminina a tarefa de proteger. E, ainda hoje, são as mulheres as principais cuidadoras da família. Então, podemos adicionar ao conceito uma boa dose de amorosidade, um sentimento que impulsiona e contorna obstáculos.  

Em fase de pré-estreia, o documentário gaúcho teve suas filmagens em 2019, sob o argumento de contar a trajetória de quatro mulheres e suas relações com a esclerose múltipla (EM). Mas, poderia ser com qualquer outra doença crônica, porque a ideia é falar de mulheres, seus comportamentos e iniciativas. Assim, a construção da narrativa parte do momento em que as protagonistas decidem ir além do diagnóstico de uma doença neurológica e progressiva. 

Destaco que a EM atinge, especialmente, mulheres jovens e lembro que atrás de cada doença crônica há ao menos uma mulher na função de cuidar. É nesse aspecto que entra meu depoimento no filme, como familiar-cuidadora. 

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Meu olhar se dá a partir do diagnóstico do meu marido, Luiz. Contrariando as estatísticas, ele apresentava a EM primária progressiva, um tipo mais raro e agressivo. Como esposa, precisei me alfabetizar rapidamente sobre esse universo, seus aspectos clínicos, emocionais e sociais. Aprendi a conviver com as peculiaridades de um tratamento com medicamentos de alto custo e com os diferentes caminhos da saúde pública. Ainda assim, constatei que, sem o Sistema Único de Saúde (SUS), as perspectivas seriam bem piores. 

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Foi pelo cuidado que presenciei as mudanças nas relações interpessoais se somando às limitações que chegavam até o Luiz. Também vi o diagnóstico impondo a ele uma nova percepção de mundo, enquanto a família e os amigos se distanciavam. Tive de entender que, antes de erguer minha voz para defender os direitos dele, precisei tocar sua essência humana e, também, atingir o meu íntimo mais profundo. Essa descoberta me levou a entregar o meu melhor à nossa relação e, assim, conseguimos construir nosso amor. 

Ainda que, como jornalista e estudiosa da educação inclusiva, o mundo de incapacidades e deficiências não me fosse estranho, foi no cotidiano que aprendi a importância efetiva de conceitos como acessibilidade. E essa necessidade se impôs com pressa, pois a evolução da doença no Luiz exigiu a migração da bengala para o andador e, posteriormente, à cadeira de rodas. 

+Leia também: Brasileiros com esclerose múltipla precisam de novos tratamentos no SUS

Sobre aprender o uso desses dispositivos e a conviver com as discriminações sociais, que emergem diante de uma doença crônica, escreveria um artigo à parte. Assim, descobri que adaptar a vida havia sido libertador tanto para o Luiz quanto para mim. 

Tal liberdade ultrapassa rampas de acesso e barras de equilíbrio, passando pelas estruturas de mobilidade urbana. Mas, o que impacta mesmo são os comportamentos que travam a existência de quem não corresponde ao padrão físico e/ou cognitivo estabelecido por uma sociedade que sequer respeita faixas de pedestres no trânsito. E há muito mais. E aqui, uma vez mais, o amor é necessário – dessa vez, contra a invisibilidade, que é o que mais dói no paciente e em quem está ao seu lado. Assim foi com o Luiz, mesmo ele tendo colecionado admiradores e amigos ao longo de seus 45 anos e em sua carreira jornalística.

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Essa perspectiva nos levou aos grupos de convivência, fundamentais no compartilhamento de saberes tanto entre pacientes quanto entre familiares. Nessa troca, chegamos à interseção entre mim e as demais protagonistas do filme. Pacientes de EM, Aline Souza, Bruna Rocha e Marcia Denardin me ensinaram a lidar com a multiplicidade da doença. Mas, essencialmente, elas me fizeram entender a necessidade da voz feminina num mundo que, todos os dias, agride mulheres pelos mais variados motivos. Mulheres com deficiência, então… Podemos definir este curta-metragem como um encontro de histórias de amor.

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A relação com a EM me fez perceber a imperfeição que é viver. Entendi que estar vivo tem mais a ver com fazer o possível do que com objetivos ideais. Como o Cinema, viver é uma arte coletiva. E é nessa coletividade que soltamos as dores e entendemos que a condição de diferença não deve retirar a dignidade e a cidadania de ninguém. Durante a produção do filme, o Luiz decidiu voar e acrescentou uma nova camada à narrativa. Aliás, falar sobre morrer também é um tema necessário. Cinéfilo que era, ele diria, com certeza, que a obra é imperdível. 

Esclerosada Não é a Vó reproduz afetos e ousa amplificar desejos e ecoar sonhos. Revela a sensibilidade de Luiz Alberto Cassol, documentarista que, generosamente, divide a direção comigo e Marcia, idealizadoras do projeto. Pontuam a história ainda os olhares da montadora Lisi Kieling e da coordenadora de acessibilidade Marilaine Castro da Costa. Este curta-metragem já nasce com recursos para todas as pessoas assistirem. E este é mais um cuidado, mais um gesto de amor.

*Erenice de Oliveira é jornalista, especialista em Cinema, estudiosa das condições de diferença visíveis ou não. Este documentário é sua primeira incursão na Sétima Arte. Nascida na zona rural de Porto Alegre, sua distração na infância já era ouvir e contar histórias. Elas poderiam vir do modesto aparelho de tv preto e branco da família ou da sua mente inquieta de pequena. Aos 53 anos, ela ainda conta histórias para sua criança interior dormir.

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