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Medicamentos a serviço da ditadura da felicidade

Médico questiona prescrição e uso desmedido de remédios como antidepressivos para lidar com tristezas e desafios da vida

Por Pablo Vinicius, psiquiatra*
17 jun 2022, 12h31

Começo este artigo fazendo um desafio: fique uns três dias chorando por causa de alguma notícia ou experiência triste, desanimado e sem energia. Você logo ouvirá de alguém que te ama: “Estou preocupado. Melhor você ir a um psiquiatra”. Ou, caso já faça um tratamento, escutará: “Melhor falar com o médico porque esses remédios não estão fazendo efeito”.

A cena que descrevo é o retrato fiel da ditadura da felicidade. De forma subliminar, estamos sendo convencidos de que sentir tristeza é anormal e preocupante. Perdemos o direito de chorar, de ficarmos melancólicos ou ansiosos diante de eventos da vida.

Sentir tristeza virou sinal de fraqueza emocional. Daí o bombardeio de posts e mensagens motivacionais do tipo “Vença a tristeza”, “Sete passos para se tornar feliz”, “Cure a ansiedade”, e assim vai…

+ LEIA TAMBÉM: Como o entendimento da depressão mudou ao longo da história

E como temos reagido? A resposta passa goela abaixo — e é assustadora. Um estudo publicado na revista científica Psychotherapy and Psychosomatic já alertava que 66% das pessoas que usam antidepressivos não possuem critérios diagnósticos que justifiquem a utilização.

Entre os idosos, a proporção é ainda mais tenebrosa: seis em cada sete tomando a medicação não apresentam critérios para isso. Outras pesquisas corroboram esses achados, ou seja, a prescrição e o uso indiscriminado de remédios para manter a sociedade feliz e anestesiada face às dificuldades da vida.

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A depressão existe e é uma doença séria. Mas está sendo diagnosticada em escala exponencial, num processo que ignora estudos e consensos. Pacientes e médicos, a qualquer manifestação de desconforto emocional, recorrem aos antidepressivos para “melhorar a vida”.

+ ASSISTA: Afinal, o que é depressão? Os sintomas e o tratamento da doença

Ora, definitivamente, os psicotrópicos não foram desenvolvidos para casamentos ruins, trabalhos enfadonhos ou crises existenciais. Foram elaborados para tratar problemas de saúde.

Se por um lado critico o uso abusivo desses medicamentos, por outro defendo a existência da doença mental, bem como a necessidade de tratá-la.

Me questionam por aí: “Doutor, se temos um remédio que nos ajuda a viver melhor, por que não usar?” Porque precisamos da dor. É ela que nos ensina que algo está errado e precisa ser mudado e nos faz sair de onde estamos e irmos em direção a um posto melhor. Ela nos faz tomar decisões e amadurecer.

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Ao anestesiar as dores humanas, tira-se a única possibilidade de transformar a vida, pois toda ruptura vem em decorrência do caos (individual ou social). Assim, sou radicalmente contra o uso de antidepressivos como anestésicos emocionais. Quando eles nos anestesiam, só tornam toleráveis situações insustentáveis. E não chegamos a lugar algum.

Um estudo realizado pelo Grupo Consumoteca em 2020 revelou que 58% dos brasileiros estão insatisfeitos com a vida. Qual a razão de tanta infelicidade? Por que somos o país mais ansioso do mundo? O combate ao uso desmedido de antidepressivos faz parte das respostas a essas perguntas.

Precisamos parar de tentar resolver sintomas e ir atrás das causas. Se começo com um desafio, termino com um alento: você tem o direito de entristecer-se, de zangar-se e de chorar, e nada disso vai fazê-lo ser considerado um doente.

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* Pablo Vinicius é psiquiatra, professor das Faculdades Integradas da União Educacional do Planalto Central, em Brasília, e autor de Antitarja Preta (Buzz Editora)

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