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Tá na internet, tá na TV, tá nos livros... tá no nosso dia a dia. O jornalista André Bernardo mostra como fenômenos culturais e sociais mexem com a saúde — e vice-versa.
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Busca insaciável pela felicidade é tema do novo livro de Daiana Garbin

Procura desenfreada por perfeição e felicidade em tempos de redes sociais protagoniza novo livro da jornalista gaúcha

Por André Bernardo
6 set 2020, 12h21

No comecinho de março, a jornalista gaúcha Daiana Garbin, de 38 anos, teclou o ponto final em seu novo livro, A Vida Perfeita Não Existe (clique aqui para ver e comprar). Já estava contando os dias para as primeiras tardes de autógrafo quando, lá pelo dia 12, um telefonema do marido, o também jornalista Tiago Leifert, com quem está casada há nove anos, deu uma freada brusca em seu entusiasmo. “Cancele todos os seus eventos, Dai. A situação vai ficar muito grave!”, avisou. Ela não quis acreditar. “Cancelar, como assim? Não posso fazer isso. Esquece!”, retrucou. Para sua tristeza, todos os lançamentos, palestras e abraços tiveram que ser cancelados. Ou, pelo menos, adiados por tempo indeterminado. O coronavírus havia chegado.

Seis meses depois do início da pandemia, Daiana se prepara para fazer (virtualmente, é claro!) tudo aquilo que, por causa do novo vírus, não conseguiu em março. Grávida de sete meses, ela questiona conceitos como “vida perfeita” e “felicidade plena” em seu segundo livro, publicado pela Editora Sextante.

Para a mãe de Lua, vida perfeita não existe, nunca existiu, jamais existirá. Ninguém é feliz o tempo todo. A não ser nos comerciais de margarina da TV ou nos stories do Instagram. “Enquanto estivermos vivas, estaremos incompletas, teremos defeitos e falharemos. Só as pessoas imperfeitas têm coragem para enfrentar medo, tristeza e frustração e transformar tudo isso em aprendizado”, ensina no posfácio.

Ex-locutora de rádio e repórter de TV, Daiana Garbin ficou nacionalmente conhecida em 2016, quando estreou o canal EuVejo, no YouTube, e lançou seu primeiro livro, Fazendo as Pazes com o Corpo, um ano depois. Na ocasião, revelou que sofria de transtorno alimentar e viveu mais de 20 anos em guerra com o corpo e a balança.

Em consequência disso, foi hostilizada por um monte de gente. “Me ofenderam com as piores palavras que um ser humano é capaz de usar para magoar o outro”, recorda. Mas foi acolhida e elogiada por outros: “Milhares de pessoas me agradeceram por ter falado abertamente sobre uma doença mental que paralisa a vida de tanta gente”.

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Algumas das mais de 3 mil mensagens que recebeu, quase todas sobre como as pessoas andam infelizes com a vida, foram parar nas páginas de A Vida Perfeita Não Existe. De lá pra cá, Daiana se dedicou a esmiuçar a origem do sofrimento humano e, para isso, conversou com dezenas de profissionais de saúde.

Na entrevista a seguir, a jornalista explica por que querer viver sem sofrimento é uma “armadilha perigosa”, alerta que tentar ser perfeito o tempo todo pode fazer mal à saúde e relata como aprendeu a lidar com os desafios da vida fazendo terapia e praticando mindfulness.

VEJA SAÚDE: Logo na introdução do seu novo livro, você avisa: “A felicidade absoluta não é possível”. Mas e a felicidade relativa, essa existe? O que te faz feliz hoje, por exemplo?

Daiana Garbin: Eu acredito em vivermos episódios de felicidade. Temos a ilusão de que, um dia, nos sentiremos completos, de que estaremos totalmente seguros, preenchidos, protegidos, e só então poderemos gozar da felicidade plena. Acontece que jamais estaremos plenos, completos, totalmente preenchidos, sem vazios. Somos seres desejantes. Desejamos porque falta algo. Falta algo porque desejamos sempre mais e mais.

Não existe o momento mágico em que o vazio deixará de existir, em que você vai parar de desejar, em que o sofrimento vai desaparecer e você vai desfrutar de uma felicidade esfuziante e permanente. A felicidade absoluta não é possível para o ser humano. No entanto, em geral, não temos consciência disso. Muitas coisas me fazem feliz hoje, mas o que me faz sentir mais feliz é viver me sentindo confortável sendo quem eu sou, acolhendo e aceitando toda a minha vulnerabilidade, fraqueza, defeitos. Assim me sinto mais corajosa e fortalecida para lidar com os momentos dolorosos da vida.

Durante quatro anos, você estudou, pesquisou e entrevistou dezenas de profissionais sobre as causas do sofrimento humano. O que descobriu?

Descobri que a gente adoece de tanto tentar ser perfeita, plena e ter uma vida sem dor. O desejo de reconhecimento nos escraviza. O desejo de estar preenchida nos aprisiona porque buscamos a plenitude como a única via possível de felicidade. Ficamos completamente cegas em busca dessa felicidade idealizada. Ansiando por uma vida livre de sofrimento e tentando lidar com o medo e a vergonha de não sermos boas o bastante, caímos na perigosa armadilha de desejar algo impossível: a vida perfeita e a felicidade plena.

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Das mais de 3 mil mensagens que recebeu de pessoas em sofrimento, houve alguma, em particular, que tenha marcado você? Por quê?

Todos os depoimentos que estão no livro me marcaram muito. Os que mais me emocionam são os que dizem “Eu me odeio, nunca vou aprender a me amar”. Percebo que isso acontece porque temos um conceito errôneo sobre o que é amar a si mesmo. Pensamos que, um dia, vamos conseguir nos amar “plenamente”. Em outras palavras, “vou aprender a me amar o tempo todo e nunca mais vou sofrer”. Essa ideia, muito parecida com a tal “felicidade plena”, nos afasta da realidade humana.

Não existe “se amar o tempo todo”, assim como não existe “felicidade o tempo todo”. Precisamos entender que somos bondade e crueldade, suavidade e agressividade, indiferença e consideração, amor e ódio, generosidade e egoísmo, inveja e admiração. Às vezes, somos sensatas; outras, levianas. Somos todos ambiguidade, impermanência, imperfeição. Eu pude voltar a viver quando mudei os conceitos que tinha sobre “ser feliz” e “amar a mim mesma”. Parei de acreditar em ser perfeita, em ter a vida perfeita, o corpo perfeito, o emprego perfeito, a família perfeita e passei a acreditar em me perceber feliz, mesmo convivendo com momentos de infelicidade, medo, angústia e dor.

À primeira vista, temos a impressão de que A Vida Perfeita Não Existe é um livro sobre sofrimento. Por que as pessoas andam tão infelizes, Daiana? Acha que elas querem conversar sobre isso?

É, sim, um livro sobre sofrimento porque a dor nos une. Qual ser humano não sente dor? Falar sobre isso e aceitar as nossas dores é que vai nos ajudar a encontrar um caminho para amar e respeitar a nós mesmos e viver mais feliz. Precisamos conversar sobre as dores que nos corroem e paralisam a nossa vida. Vivemos uma perpétua sensação de insuficiência. É o que eu chamo de sensação de inadequação, fracasso, vergonha, culpa, insegurança, vazio, desamparo…

Escrevi este livro com a intenção de dar ao leitor coragem para pensar sobre os seus sentimentos e as suas emoções. Para pensar sobre o desamparo, a ausência, a falta. Para questionar que felicidade é essa que você está buscando. Viver exige a coragem de acolher a infelicidade, o medo, a angústia, a dor. Parece contraditório, mas é justamente ao aceitar e acolher a infelicidade, a angústia, o medo, a dor, o fracasso, a vulnerabilidade, a impermanência, a ambivalência e a imperfeição de ser humano que podemos viver mais momentos de felicidade.

O título de seu primeiro livro, lançado em 2017, é Fazendo as Pazes com o Corpo. Você já fez as pazes com o seu?

Sim, fiz as pazes, aprendi a respeitar e honrar o meu corpo, e aprendi muito mais do que isso. Sinto-me confortável na minha vida, na minha mente, no meu corpo, sendo quem sou. Não sinto mais vergonha de mim porque aceito toda a minha imperfeição. Me percebo feliz em vários momentos porque sei que a dor sempre existirá, é parte da vida. Lido melhor com minhas angústias porque sei que não existe ser humano sem angústia. Compreendo melhor meus desejos e frustrações porque aprendi que jamais terei tudo que quero e jamais irei parar de desejar e me frustrar.

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Em algum momento, se arrependeu por ter se exposto tanto ao contar que sofria de transtorno alimentar e vivia em guerra com seu corpo? Quatro anos depois, faria diferente?

No início do meu canal em 2016, eu me arrependi. Foi muito doloroso, mas, quando eu comecei a receber os depoimentos das pessoas em sofrimento, e de pessoas que perceberam que estavam doentes e começaram a fazer tratamento médico por causa dos meus vídeos, percebi que estava no caminho certo. O silêncio e a negação das doenças mentais fazem mais e mais pessoas adoecerem. Precisamos vencer o preconceito e entender que a doença mental é uma doença como qualquer outra e precisa de tratamento médico e psicológico.

Dos sentimentos descritos no novo livro, quais deles faziam (ou fazem) mais mal à sua saúde física e mental? Inveja? Vergonha? Ciúme? 

Todos eles fazem muito mal e podem nos levar a uma prisão emocional. Quando a vida parece ruir diante da angústia de não gostar de quem somos, da inveja, do ressentimento e da culpa que sentimos, quando a vergonha que temos de nós mesmos se torna insuportável, precisamos descobrir um caminho para não adoecer. Eu acredito que esse caminho é aprender a olhar para dentro e elaborar as sombras da nossa personalidade. É ter a responsabilidade de entrar em contato com nossos sentimentos brutos, primitivos e obscuros.

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Hoje em dia, como procura lidar com esses sentimentos? Fazer análise ou meditação, por exemplo, ajuda a superá-los?

Eu faço análise e medito. Estudo e pratico mindfulness desde 2016. Estou concluindo a minha formação como instrutora de mindfulness e penso que viver com atenção, abertura e curiosidade, no momento presente, é uma ferramenta muito poderosa para lidar com os desafios da vida.

Aprendi que, em vez de lutar contra si mesmo, você pode sentir o que está presente e se oferecer amor, carinho e acolhimento por ser humano e imperfeito. Eu finalizo meu livro com um convite aos leitores. Como seria se abrir à possibilidade de conhecer o estranho que vive em você? Como seria transformar o impulso de julgar em intenção de compreender? Como seria transformar o hábito de se comparar em intenção de aceitar e acolher com bondade a si mesmo e aos outros? Será que, em vez de julgar, culpar, ruminar, podemos criar um espaço para sentir?

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