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Seremos pessoas melhores no pós-pandemia?

Psicóloga reflete sobre o fardo e o legado da crise da Covid-19 em nossas emoções, vivências e laços sociais

Por Ana Gabriela Andriani, psicóloga*
13 nov 2020, 10h36

Fala-se muito que o coronavírus vai abrir uma nova era na humanidade. Que as pessoas serão mais solidárias, terão maior cuidado com a natureza — os efeitos benéficos do confinamento em relação à poluição, por exemplo, já são evidentes — e estarão um passo mais à frente para uma sociedade mais justa e humanitária. Mas isso não deve ser, de fato, o que acontecerá no pós-pandemia.

A ideia de que as pessoas vão se tornar melhores só por conta dos últimos meses pode ser uma ilusão. Isso vai depender, na verdade, de cada um. O que se percebe é que as virtudes, para quem já tem virtudes, estão intensificadas neste momento. Mas o mesmo vale para quem não as tem: o individualismo também está mais forte agora.

A pandemia representa um laboratório de emoções. O modo como cada um lida com essa situação mostra quem é mais ansioso, mais obsessivo, mais solidário ou mesmo quem tem predisposição à compulsão e ao vício.

De maneira geral, a pandemia e o confinamento aumentaram o consumo de álcool e drogas. Para quem já tem predisposição à compulsão, isso vem se intensificando, numa tentativa de lidar com a ansiedade. Também observamos um aumento no uso de medicamentos ansiolíticos e antidepressivos, porque as pessoas estão tensas com a falta de controle sobre a situação, além do sentimento de frustração, de não saber o que vai acontecer e de ter adiado ou abandonado planos feitos previamente.

Num primeiro momento, todos estavam muito assustados e não sabiam o que fazer. Existia o receio de que fosse o apocalipse. Mas também tinha muita gente preocupada com a forma que ia se organizar em casa, já que não houve tempo para fazer um planejamento.

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Num segundo momento, quando muitas pessoas já estavam se adaptando à nova rotina, trabalhando e estudando no próprio lar, as preocupações foram sendo sentidas nas relações interpessoais. Vimos crises de famílias e de casais, o que se pode verificar na alta de separações durante a pandemia. Segundo levantamento do Colégio Notarial do Brasil (CNB), elas cresceram 1,9% só em junho deste ano em comparação ao mesmo mês de 2019.

Agora, as preocupações estão também nas questões relacionadas à instabilidade econômica, receio de perder o salário, o emprego, o padrão de vida. As pessoas estão mais adaptadas à rotina da casa. Muitas, inclusive, dizem que não gostariam de voltar ao trabalho presencial. Porém, é preciso ficar atento ao que é vontade e o que é receio. Existem pessoas que estão com medo de voltar à vida normal, sair e encontrar os outros. Esse é um grupo que, em geral, tem menos recursos emocionais para lidar com a situação. É um grupo mais frágil e que tem uma tendência a pânico e a crises de ansiedade.

Essas condições foram intensificadas nos últimos meses, especialmente para quem tem TOC (transtorno obsessivo-compulsivo). Em tempos de medo do contágio e de necessidade frequente de assepsia, por exemplo, parece que os rituais de TOC são justificados, e essas questões, então, surgem com mais força.

Será possível observar um aumento da ansiedade no pós-pandemia, principalmente causada pela instabilidade econômica e profissional. A ansiedade tem a ver com nosso senso de responsabilidade, com uma necessidade de alta performance e de sucesso. Com a instabilidade, muitos estarão com medo de perder seus empregos e não ter como se manter financeiramente.

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No entanto, as lembranças ruins deste período não devem durar muito tempo. Com a vacina, isso deve passar e, em um ou dois anos, não vai fazer mais parte da nossa vida, assim como aconteceu com outras epidemias. A gripe espanhola, por exemplo, é uma memória histórica, mas não está mais presente no cotidiano das pessoas.

Há, entretanto, uma diferença para aqueles que sofrem de alguma questão emocional: o que se percebe, através de pesquisas, é que as pessoas que sofrem de crises depressivas ou de pânico podem ver os efeitos da situação atual reverberarem por anos. E aí pode ser o caso de entrar com ajuda profissional.

A pandemia também nos colocou diante da mortalidade. A morte deixou de ser uma ideia abstrata e passou a fazer parte do nosso dia a dia. Em situações assim, podemos aproveitar para ampliar nosso olhar e trazer novos significados para a maneira como pensamos, sentimos e agimos. Gosto sempre de pensar que toda situação de crise, que nos coloca frente à finitude, pode ser uma oportunidade de questionamento sobre o sentido da vida, sobre as escolhas que fazemos. Então saiba que esse momento pode ser transformador. Pode ser um momento de ressignificação. Mas é preciso querer.

* Ana Gabriela Andriani é psicóloga, mestre e doutora pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)

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