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Ficou quente para a saúde

O ano de 2016 deve registrar a maior temperatura média da história — e o calor da pesada é capaz de armar um caldeirão de doenças. Como se defender?

Por Sílvia Lisboa (colaboradora)
Atualizado em 12 dez 2016, 11h56 - Publicado em 12 abr 2016, 10h20

Em agosto de 2003, uma onda de calor sem precedentes tomou conta da Europa. Durante sete dias, os franceses, acostumados a verões amenos, viram-se debaixo de temperaturas de 40 °C. Em Portugal, a falta de umidade favoreceu um incêndio monumental que deixou em cinzas 10% das florestas do país, e o ar abafado ficou ainda mais poluído.

A Inglaterra, por sua vez, registrou seu primeiro calor de 37,7 °C. Resultado: casos de desidratação, queimaduras, problemas respiratórios, infartos e AVCs apinharam hospitais de Copenhague a Lisboa. Quando o calor cedeu, as autoridades de saúde chegaram a um cálculo assustador. Pelo menos 70 mil pessoas haviam morrido — quase 15 mil só na França.

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As ondas de calor são definidas como períodos de cinco dias em que a temperatura fica 5 °C acima da média. Elas já ocorreram várias vezes na história, mas, agora, com o planeta quase 1 °C mais quente, esses eventos estão mais frequentes. E a ascensão dos termômetros preocupará ainda mais neste ano.

A agência de meteorologia do Reino Unido, Met Office, prevê que 2016 será o mais quente já registrado desde a era pré-industrial, título que pertencia até então a 2015. “Se a temperatura global continuar a subir, o número de ondas de calor só vai aumentar”, alerta o climatologista Carlos Nobre, uma das maiores autoridades brasileiras no tema, hoje na presidência da Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Nível Superior (Capes).

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Entre 2030 e 2050, a Organização das Nações Unidas (ONU) estima que 250 mil pessoas morrerão por ano devido à elevação sem trégua dos termômetros. Apenas o estresse provocado pelo calor fora do normal pode custar, no futuro, a vida de 38 mil idosos anualmente.

Um levantamento alemão publicado no periódico Heart revela que 5 °C a mais, como os registrados nas ondas de calor, representam um incremento de 9,5% na mortalidade por doenças cardiovasculares. O médico Hugh Montgomery, professor do University College London, na Inglaterra, lamenta:

Estamos enviando à atmosfera o equivalente a cinco bombas de Hiroshima a cada segundo. Isso faz com que eventos extremos fiquem mais extremos

Não é à toa que o acordo para frear o aquecimento global firmado em dezembro passado entre 195 países na Cúpula do Clima de Paris, a COP 21, vem sendo saudado como a medida de saúde pública mais importante do século. Desde a Eco 92 não havia um consenso internacional sobre a necessidade de brecar a temperatura para salvar vidas.

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A revista científica The Lancet publicou recentemente um estudo mundial mostrando como as oscilações térmicas estão abalando a saúde da humanidade. Conduzido em vários países, entre eles o Brasil, o levantamento revelou que cerca de 7,7% das mortes no mundo podem ser creditadas ao sobe e desce dos termômetros.

No estudo, o frio extremo figurou como a principal ameaça. O calor, porém, foi responsável por uma escalada de eventos súbitos, como infartos e derrames. “Nosso aparato fisiológico é menos eficiente para lidar com altas temperaturas”, explica um dos autores da pesquisa, Paulo Saldiva, médico patologista e professor da Universidade de São Paulo (USP). A gente sua muito, os vasos dilatam, a pressão cai…

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Em pessoas predispostas, essas alterações podem acabar com o vigor do músculo cardíaco. Bote a desidratação no meio e se vê um cenário propício a piripaques como infartos e AVCs.

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A reviravolta no clima também traz outros impactos ao organismo não menos desprezíveis. O aumento da exposição a insetos transmissores de doenças é um deles. O Anopheles, transmissor da malária, e o Aedes aegypti, portador da dengue, da febre chikungunya e do zika, adoram calor e chuva.

Males causados pela má qualidade da água representam outro perigo em tempos de sol de rachar: uma prosaica diarreia mata 760 mil crianças todos os anos. O clima, nesses casos, não é o único culpado. “A falta de políticas públicas, saneamento deficitário e habitações precárias contribuem para esses problemas serem muito piores”, afirma o climatologista José Marengo, que integra o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, o IPCC.

Regiões intensamente urbanizadas, como São Paulo, podem penar ainda mais. A floresta de asfalto da cidade devolve à atmosfera doses elevadas de radiação infravermelha. “Isso tornou a capital paulista 4 a 5 °C mais quente, e as chuvas mais intensas nos últimos 50 anos”, aponta Mozar Salvador, do Instituto Nacional de Meteorologia (InMET).

Já as chuvaradas, outro resultado do calorão, causam inundações e deslizamentos com centenas de vítimas. Sim, pode botar na conta do aquecimento global.

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Plano de emergência

Experts em clima e em saúde pública estão se unindo para pensar em soluções capazes de segurar o ponteiro do termômetro e resguardar a humanidade. Boa parte delas, como é de esperar, são reflexo do cuidado com o meio ambiente.

Uma pesquisa publicada na Nature Geoscience demonstra que a queda no número de queimadas registrada na última década na Amazônia pode ter poupado até 1,7 mil vidas por ano na América do Sul. “Foram evitadas mortes prematuras de adultos que já tinham doenças respiratórias”, exemplifica o físico Paulo Artaxo, professor da USP e um dos responsáveis pelo trabalho.

Na última COP 21, o Brasil se comprometeu até 2025 a zerar o desmatamento na Amazônia legal, recuperar 12 milhões de hectares de matas degradadas, o equivalente ao território da Inglaterra, e reduzir em 37% a emissão de gases do efeito estufa. É um esforço que deverá ser traduzido em mais vidas salvas.

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Algumas medidas para se blindar do calor, aliás, não dependem das autoridades. Praticar exercícios pelo menos quatro vezes por semana é uma delas. Um estudo conduzido na USP pela geriatra Beatriz Trezza revela que idosos ativos ficam mais protegidos contra os efeitos do calor na memória e no raciocínio.

É como se a atividade física ensinasse o corpo a ter um melhor controle térmico. Saldiva recomenda deixar o carro em casa e ir trabalhar a pé ou pedalando, inclusive a fim de reduzir as emissões de CO2. Andar, em média, 4 km por dia leva a uma perda de 1,5 kg por mês — ponto para a prevenção da obesidade e do que vem junto com ela.

Mais: tente diminuir em 20% a ingestão de carne vermelha. A criação de gado emite metano, um dos gases associados ao aquecimento global. De bônus, você se protege contra câncer e males do coração. Como ensina Saldiva, “todas as medidas sustentáveis são saudáveis também”.

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