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Pão: dá para comer sem medo

Mesmo sendo demonizado, esse alimento se mantém em alta e vem se reinventando em receitas mais saudáveis. Tem gente até que começou a prepará-lo em casa

Por Thaís Manarini
Atualizado em 27 nov 2019, 16h04 - Publicado em 16 out 2019, 10h30

Farinha, água, fermento e sal. Você só precisa de quatro ingredientes para fazer um belo pão — algo que nossos ancestrais descobriram há coisa de 6 mil anos. “Se considerar o tipo ázimo, não fermentado, a receita pode ter até 20 mil anos”, conta o consultor gastronômico Luiz Américo Camargo, pesquisador de panificação caseira desde 1990 e autor do livro Pão Nosso (Editora Panelinha, em parceria com o Senac).

“O alimento ajudou a organizar o modo de produção agrícola, já que sua preparação obrigou as tribos a cultivar regularmente trigo, centeio, cevada etc.”, explica Camargo. Ou seja, o pão pode não ter feito parte da dieta dos homens das cavernas, mas também não entrou em nossa vida ontem, como seguidores de menus à base de carnes e vegetais costumam dar a entender.

Mais do que isso: ele está longe de ser símbolo de uma alimentação desajustada. “Italianos, franceses e povos de países do Oriente Médio são grandes comedores de pão. E eles têm menos problemas de saúde do que outras populações com médias bem menores de consumo”, compara Camargo.

Ainda assim, a onda da low carb, dieta com baixa ingestão de fontes de carboidratos, angariou vários adeptos. Quem nunca viu um amigo ou familiar fugir de pães, massas e arroz para emagrecer? “Na maioria das vezes, cortes assim levam a uma redução na ingestão calórica e, consequentemente, à perda de peso”, justifica a nutricionista Luciana Lancha, de São Paulo.

Ocorre que isso não é sinal de sucesso. Após um tempo seguindo um cardápio tão restritivo, a tendência é voltar ao padrão (ou seja, ao peso) anterior. “Em vez de focar em um grupo alimentar, o ideal é buscar mudar o estilo de vida. Os resultados demoram mais a aparecer, mas são realmente duradouros”, garante Luciana.

Cada um no seu forno

Há inúmeros tipos de pão. O expert Luiz Américo Camargo ensina as diferenças entre alguns dos mais conhecidos

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Italiano: pasme: é criação de imigrantes italianos de São Paulo. “As boas padarias fazem com farinha, água, fermento natural e sal.”

Australiano: foi inventado por uma rede de restaurantes que nem australiana é. Há receitas que levam chocolate, outras café… Nada padronizado.

Pão de fôrma: a massa dos mais industriais às vezes nem fermenta direito. Só é batida. Evite os lotados de ingredientes.

De centeio: “Um clássico!”, diz Camargo. Se bem-feito, fica muito bom. A fermentação longa dá sabor marcante e leveza à receita.

Francês: pão simples, crocante e, em geral, com durabilidade curta. “Alguns padeiros abusam de açúcar e gorduras.”

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Pão sírio: é da família dos pães chatos, como pizza e foccacia. É ótimo para acompanhar refeições e montar sanduíches.

Bisnaguinha: a da padaria segue a tradição dos pães de leite. Já a industrial costuma esbanjar açúcar, gordura e aditivos. Olhe o rótulo.

Croissant: mais um clássico. Para Camargo, poucos o preparam direito. “Enrolados massudos não são croissants”, crava o especialista.

O pão dentro de uma rotina saudável e balanceada

Para além do emagrecimento, há quem enxergue a exclusão de pães e afins como solução para domar picos de açúcar no sangue e baixar o risco de diabetes e doenças do coração. “Mas, até o momento, não há evidências de que a redução exagerada de carboidratos faça realmente bem à saúde”, afirma a nutricionista Débora Bohnen Guimarães, coordenadora do Departamento de Nutrição da Sociedade Brasileira de Diabetes.

“O ponto-chave é a proporção. Porque, de fato, o excesso traz problemas”, pontua a nutricionista Isabela Pimentel Mota, da Sociedade Brasileira de Cardiologia.

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Quem viu de perto os dois lados da moeda foi a pesquisadora Sara Seidelmann, em um estudo conduzido no Brigham and Women’s Hospital, nos Estados Unidos, e publicado no respeitado periódico científico The Lancet.

Após analisar 15 428 americanos e cerca de 432 mil indivíduos de mais de 20 países, ela constatou que tanto a alta (70% ou mais) como a baixa (40% ou menos) porcentagem de calorias vindas de fontes de carboidratos elevavam a mortalidade. O menor risco ficou atrelado a um consumo de 50 a 55% de calorias representadas pelo nutriente — valor sugerido há tempos pelos especialistas.

Sara ressalta, porém, que, se as dietas pobres em carboidratos contam com proteínas e gorduras de origem vegetal como substitutas, o risco de morrer acaba sendo menor do que quando a troca é por proteínas e gorduras animais (carne, ovo…).

De qualquer maneira, o recado é que ninguém precisa dar adeus ao pãozinho de cada manhã. “Esse alimento faz parte da dieta humana há dezenas de milhares de anos e pode integrar uma rotina saudável”, tranquiliza a estudiosa. Para ela, o pulo do gato é focar em versões ricas em grãos integrais, que fornecem fibras. “Elas costumam ter índice glicêmico baixo e ajudar na saciedade”, concorda Débora.

Por falar em índice glicêmico (ou IG, para os mais íntimos), que é a velocidade com que o alimento é convertido em açúcar e liberado na circulação, Luciana Lancha frisa que esse conceito não precisa ser levado a ferro e fogo pela população em geral.

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“Embora o pão branco tenho um alto IG, ele não é consumido puro”, explica. Quando o associamos a um queijo, por exemplo, o açúcar demora mais a dar as caras no sangue, porque ambos devem ser digeridos e absorvidos. “O organismo não pega o pão primeiro e depois o queijo. Vai tudo junto”, diz Luciana.

Apesar de não ser um sacrilégio sucumbir ao pão branco, o integral realmente soma mais vantagens. “É que o refinamento leva embora fibras, nutrientes e fitoquímicos”, resume Isabela.

Para o nutricionista Igor Ucella, do Centro Universitário Senac Santo Amaro, na capital paulista, esses elementos podem vir de outras fontes, não só do trigo. “A panificação tem trazido opções com mandioquinha, batata-doce, inhame…”, exemplifica.

O que considerar na hora da compra

No pacote: é interessante que a farinha integral, com mais fibras, apareça em primeiro lugar na lista de ingredientes, que é em ordem decrescente. Compare os teores de sódio e gorduras — em um pão com castanhas, é natural ter mais desse nutriente. Prefira os produtos com receitas mais simples, sem mil ingredientes.

Pão branco: fornece energia de forma mais rápida. Por isso, pode ser indicado no pós-treino para acelerar a recuperação. Porém, no processo de refinamento, perde fibras, vitaminas e minerais. E os picos de glicose facilitam o ganho de peso.

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Pão integral: preserva mais nutrientes e fibras, que contribuem para a saciedade e auxiliam o trânsito intestinal. No entanto, nem todo mundo curte de cara o sabor do pão 100% integral. Uma boa é começar aos poucos, com misturas de farinhas.

Ops, embolorou: as manchas azuis que surgem no pão após um tempo são sinais de fungo. Há quem tire essas partes e coma o resto. “Mas os fungos já podem ter se espalhado. Só não enxergamos”, alerta Carmen Tadini, engenheira de alimentos do Centro de Pesquisa em Alimentos (FoRC), da Universidade de São Paulo. Evite!

Por que o mais brasileiro dos pães é conhecido como francês?

Não se engane: o carro-chefe das padarias nacionais não tem nada de gringo. “Esse pão nem existe na França”, nota Rui Gonçalves, vice-presidente do Sindicato da Indústria de Panificação e Confeitaria de São Paulo (Sampapão). O que aconteceu foi o seguinte: ao vir para cá, no início do século 19, a corte portuguesa não gostou da receita tupiniquim.

“A nova clientela começou a exigir pães mais branquinhos, como os dos franceses. Daí surgiu um pão de produção cotidiana, com farinha de trigo branca, que passou a ser chamado, com o tempo, de francês”, esclarece Camargo.

Outros apelidos pelo brasil

Cacetinho: é desse jeito que os gaúchos se referem ao famoso pãozinho.

Jacó: em Sergipe, pode encostar no padeiro e pedir por ele.

Careca: esse é o nome conhecido entre quem mora no Pará.

Carioquinha: foi batizado assim no Ceará. Lá também se chama pão de sal.

A febre dos pães artesanais

Segundo a americana Sara Seidelmann, os pães artesanais, produzidos por métodos semelhantes aos dos tempos antigos, são mais rústicos. “E provavelmente melhores para a saúde”, avalia.

A expert em panificação Julice Vaz, dona de um dos empreendimentos pioneiros em oferecer esse tipo de produto, em São Paulo, observa que a digestão é facilitada. “Ao usar um fermento natural, formado por micro-organismos, não é necessário incluir mais nada na receita”, justifica.

“Esse pão ainda tem melhor sabor e aroma, além de maior durabilidade”, afirma. Não à toa, tem muita gente cultivando seu próprio fermento e preparando o alimento em casa.

Mas não tem problema buscar o pão de cada dia no supermercado. “Ele inclusive está sujeito a regras e fiscalização mais controladas”, aponta Carmen Tadini. É preciso checar ingredientes e tabela nutricional e comparar os pacotes. “Essa sempre é uma atitude saudável”, frisa.

Comendo com parcimônia e fazendo boas escolhas, até quem tem diabetes pode manter o pãozinho na rotina. “O carboidrato é sinônimo de energia e vida, especialmente para quem usa insulina”, informa Débora.

A retirada acentuada do nutriente traz prejuízos para esse pessoal, como risco de crises frequentes de hipoglicemia — quando o açúcar baixa demais, vêm confusão mental, palpitações e outros incômodos. Já o mau humor pega todo mundo que é fã do pão e tenta limá-lo da dieta. Sorte que ninguém tem motivos para cometer essa insensatez.

Botando a mão na massa

Cada vez mais pessoas estão preparando o próprio pão. Eis alguns pontos importantes do processo

Fermento natural: tem leveduras e bactérias que você deve alimentar com farinha e água. Na digestão vagarosa de amido, elas liberam gases. O pão cresce e ganha sabor e aroma únicos.

Fermento biológico: feito industrialmente com leveduras. Como a concentração delas é alta, gera gases rapidamente e o pão se desenvolve logo. A dica é usar menos para um melhor sabor.

Na máquina: a sova, o descanso e o tempo de forno são no aparelho. Se usar bons ingredientes e fermentação lenta, também é artesanal. Mas se perde a parte manual do processo.

Os melhores ingredientes

Sementes: elas são fontes de nutrientes, como proteínas e gorduras boas. Prove as de abóbora, girassol, linhaça e chia.

Oleaginosas: mais redutos de substâncias do bem, a exemplo de gorduras insaturadas e minerais. Teste castanhas, nozes e amêndoas.

Raízes: batata-doce, inhame e beterraba deixam a receita mais nutritiva e fornecem sabor, cor e aroma diferenciados.

Farinha integral: deixa o pão com mais fibras, vitaminas e minerais. Se quiser acostumar o paladar aos poucos, tudo bem mesclar com a branca.

O que pode acompanhar o pão no café da manhã

Queijos magros: ricota e minas frescal são do time. Só não abuse. Se a fatia parar em pé, sinal de que está grande demais.

Ovo mexido: ele carrega proteínas. Por isso, ao combiná-lo com o pão, a glicose não dispara no sangue. Maneire no óleo.

Manteiga: essa é tradicional. Mas possui gordura saturada, cujo excesso eleva o colesterol. Use só um pouco.

Os ingredientes parceiros no jantar

Peixe, frango…: para uma refeição, inclua carne magra, frango desfiado ou atum. Embutidos não são legais.

Salada fria: Alface, cenoura, tomate e companhia adicionam vitaminas, minerais e fibras ao lanche. Capriche.

Vegetais cozidos: no inverno, eles caem como uma luva. Abobrinha, berinjela, espinafre… Varie cores e sabores.

Pastinhas:grão-de-bico cozido vira uma pasta que deixa o sanduíche mais apetitoso e saudável.

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