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A nova cara da carne

Chegam ao mercado hambúrguer e até carne moída à base de vegetais prometendo o sabor dos similares de origem animal. Mas esses produtos são nutritivos?

Por Thaís Manarini
Atualizado em 16 jan 2020, 10h29 - Publicado em 15 jan 2020, 10h10

Reduzir a carne vermelha no dia a dia passou a fazer parte de uma agenda necessária no mundo inteiro. Recentemente, a importância da medida foi reconhecida no relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) da Organização das Nações Unidas. Para resumir em poucas linhas, há dados indicando que a atividade pecuária gera mais gases do efeito estufa do que todos os meios de transporte juntos. É aquecimento global na certa — e desastres naturais se aproximando a passos largos.

Para piorar, abusar do alimento traz repercussões negativas à nossa saúde. “O excesso está associado a um maior risco de doenças cardiovasculares, diabetes e até alguns tipos de câncer”, cita a nutricionista Dirce Maria Lobo Marchioni, professora responsável pelo projeto Sustentarea, do Núcleo de Extensão da Universidade de São Paulo (USP) sobre alimentação e sustentabilidade.

A julgar pelo prato, o brasileiro está na rota do perigo. “O consumo anda em torno de 700 gramas por semana, enquanto a recomendação é de 400 gramas”, estima a nutricionista Marcia Gowdak, da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp).

Somando lé com cré, dá para entender por que o cenário favorece uma nova onda: a de hambúrgueres vegetais que prometem características similares às da versão bovina. “Imitar a carne vermelha é uma estratégia inteligente para atender a uma emergência global”, defende a nutricionista Alessandra Luglio, consultora da Fazenda Futuro, que fez barulho ao apresentar o primeiro hambúrguer vegetal nesses moldes — há beterraba na fórmula para remeter até à cor do disco tradicional. Ele está em algumas redes de fast-food e também na parte de congelados de supermercados. Em novembro, a empresa (ou healthtech) surpreendeu de novo, desta vez com uma carne moída à base de plantas.

Para Marcos Leta, sócio-fundador da marca, os produtos são muito democráticos: “Eles agradam tanto os vegetarianos e veganos que sentem falta do sabor da carne vermelha como os onívoros que buscam diminuir seu consumo, independentemente do motivo”.

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Alessandra ressalta que é muito difícil mudar completamente hábitos tão enraigados, como o apreço por bife. Daí a vantagem de alternativas que alimentam esse lado afetivo ao mesmo tempo que causam menos impacto no meio ambiente.

Com mais de 90 anos de existência e um grande portfólio de produtos para vegetarianos e veganos, a Superbom foi outra empresa que abraçou a causa do hambúrguer de plantas idêntico ao de carne. “O Burger Gourmet Vegan é mais direcionado àquele público que não quer mudar totalmente, mas deseja uma opção de troca para uma ou duas vezes na semana”, diz Cristina Ferreira, diretora industrial e de P&D da marca. São os chamados flexitarianos. Essa turma também não passou batida pela Seara, que lançou o Incrível Burger — 100% à base de vegetais, ele promete “sabor, textura e aparência do tradicional”.

A nutricionista Gabriela Parise, da clínica NutriOffice, na capital paulista, enxerga as novidades com bons olhos. “É um movimento para as pessoas começarem a se conscientizar”, acredita. “Tem muita gente que quer maneirar na carne por questões éticas e ambientais, e não por causa do sabor”, reforça a profissional, que também é integrante da Sociedade Vegetariana Brasileira.

Para Marcia, da Socesp, não há dúvida de que o apelo à sustentabilidade faça sentido. Mas, do ponto de vista da saúde, é preciso colocar um pé no freio. “São itens altamente processados e, mais do que isso, ricos em gordura saturada e sódio”, aponta.

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Cabe ressaltar que exagerar nesse tipo gorduroso faz subir o colesterol ruim (o LDL) e acarreta maior probabilidade de formação de placas nas artérias. “Já o excesso de sódio eleva a pressão tanto de hipertensos como de pessoas saudáveis”, lembra a nutricionista. Falamos do principal fator de risco para doenças cardiovasculares.

“O que indicamos, na verdade, é uma alimentação mais próxima da natureza, com comida de verdade”, defende Dirce. Por isso, ela tem ressalvas em relação a esse mercado crescente da carne-que-não-é-carne. “Além de estarmos em um momento de ameaça real ao meio ambiente, é importante salientar que temos um grave quadro global de obesidade”, alerta. Nesse contexto, ela não vê vantagem em trocar um alimento calórico e gorduroso por outro com o mesmo perfil — ainda que seja à base de plantas.

“Em nenhum momento essa categoria foi desenhada para ser a mais saudável do mundo”, rebate Alessandra, da Fazenda Futuro. “A ideia principal é trazer o sabor, o aroma e a textura da carne”, enfatiza.

De olho nisso, ela pede que as comparações nutricionais sejam feitas em relação aos hambúrgueres bovinos — não ao bife comum e muito menos a um prato de salada (veja no fim da matéria uma comparação). Não significa, porém, que a receita não possa ser melhorada.

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Poucos meses após o lançamento do Futuro Burger, a empresa já reformulou o produto, chamando-o de 2.0. “Este apresenta menos gordura e sódio”, conta Alessandra. “A tecnologia está evoluindo, e a gente também”, observa Leta.

Agora, já que é para focar no universo dos hambúrgueres, vale recordar que esse tipo de alimento não é para todo dia. De acordo com Gabriela, mesmo a versão vegetal representa uma opção para ocasiões especiais. Até porque ela provavelmente será acompanhada de queijo, catchup e maionese — para ficar nos ingredientes básicos. Portanto, a refeição ganha doses extras de gordura e sódio.

Já aquele bife que surge com arroz e feijão no prato do brasileiro deve, segundo Marcia, dar as caras em, no máximo, três refeições semanais. Para o seu lugar, nada de hambúrguer.

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E a carne moída à base de plantas é encarada com ressalvas. Afinal, três colheres concentram 9 gramas de gorduras saturadas — quase metade do que seria ok no dia inteiro. Dirce sugere buscar alternativas como frango, peixe ou ovo, que trazem menos impacto ambiental. E também adaptar receitas. “Um picadinho de carne pode ser feito com legumes”, exemplifica.

Daqui pra frente, certamente outros produtos à base de plantas disputarão espaço com equivalentes de origem animal. Mas só essa característica não os torna necessariamente equilibrados. “Temos que permanecer de olho nos rótulos”, ensina Dirce.

Além disso, faz bem entender o espaço de cada alimento dentro da rotina. Só assim possíveis substituições de fato valerão a pena.

Um resumo dos hambúrgueres vegetais

Embora as receitas vegetais concentrem leguminosas e, por isso, esbanjem proteínas, a nutricionista Marcia Gowdak pede atenção ao alto teor de gorduras saturadas. É que o abuso tem impacto negativo no peso e no coração. Outra coisa que varia demais é o sódio. Tenha em mente que, para um adulto, o limite são 2 gramas do mineral por dia. Há produto à base de plantas que fornece quase metade disso. Vasculhe o rótulo!

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E as carnes moídas?

O principal dilema em relação à versão vegetal, feita com farinha de grão-de-bico e proteínas de soja e ervilha, reside na presença marcante de gorduras saturadas: em apenas três colheres são 9 gramas. Isso corresponde a 41% do que é indicado a um adulto para o dia todo. E dá quase cinco vezes mais do que encontramos na mesma porção de acém moído. O valor de sódio também não é desprezível. Tem que maneirar.

Nova cara da carne
(Ilustração: Jonatan Sarmento/SAÚDE é Vital)

Um burger bovino de laboratório

Essa é a proposta do pesquisador Mark Post, da Mosa Meat. Após anos de estudos na Universidade de Maastricht, na Holanda, ele chegou a um hambúrguer feito a partir de células de músculos de vacas — elas são capazes de se multiplicar fora do bicho. Logo, nenhum animal é sacrificado. De acordo com sua equipe, a intenção é botar o produto no mercado em 2021. Do ponto de vista nutritivo, continuaria exigindo moderação, sobretudo por causa do colesterol e das gorduras.

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